A beleza da tristeza

Dizem que quando estamos tristes escrevemos melhor ou temos maior facilidade para escrever. Tudo bem, na companhia da tristeza a gente consegue extrair beleza das coisas mais improváveis. A alegria não é tão profunda quanto a tristeza. Nem tão linda. Meio louco alguém achar a tristeza bonita, mas fazer o quê, se a dor nos abre os olhos para tantas coisas da vida?

Quando sozinho, me pego colecionando lembranças, colocando-as em gavetas que, quando triste, não hesito em abrir. E é para isso que servem as gavetas, para nos lembrar o quão feliz já fomos. E eu tenho tantas gavetas, tantas lembranças. Saber ser feliz, vasculhar alegrias que ainda se demoram dentro de nós, achar saídas nas frestinhas de sol que nos tocam pela manhã, é um treino diário e não uma divindade de poucos.

A tristeza é uma condição alheia ao coração. Quando a gente não sabe o que sente, o coração aperta. E aperta em busca de uma resposta, de um alívio, de uma desculpa para não encarar o que realmente sentimos. A gente gosta de ser enganado, de mentir para nós mesmos para sofrer menos, de colocar a culpa por todo o nosso sofrimento no outro. A gente foge para não sentir; foge para não roçar a pele na aspereza da dor.

A beleza da tristeza está na busca pela compreensão do que sentimos. Não há como fazer passar a dor sem entendê-la, sem lhe dar a devida atenção. E, se ela insistir em latejar, saiba que pode ser vencida por um abraço. A dor precisa ser entendida, ouvida, convencida de que não precisa espernear. É como uma criança que tenta chamar atenção. Dê-lhe o cuidado merecido, mas não deixe que fique mimada.

Não confio na alegria genuína sem a passagem de um grande e longo abraço da tristeza. A vontade de sumir é normal, e precisamos aprender a ouvir a noite para perder o medo do silêncio e dos amores que ainda virão. Esquecer os conselhos que os outros dão e escutar mais o nosso coração. E, se ele não disser nada, continue a puxar assunto, pois, para se proteger, às vezes ele se fecha, fica recluso, até, naturalmente, decidir que chegou a hora de voltar a ser o poço de amor que sempre foi.

Chega um dia em que, por caminhar constantemente ao nosso lado, a tristeza nos leva a pensar que não há espaço para ninguém dentro da gente. Achamos que tudo o que a vida pode nos proporcionar já foi sentido. Mas, se para sofrer menos for preciso amar menos, vou ter que dizer ao coração que é bom ir se acostumando, pois, sem grandes dores, não teríamos o prazer de descobrir as grandes alegrias. E, sem dúvidas, se sou feliz hoje, é porque amo as minhas tristezas.

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4 comentários abaixo sobre A beleza da tristeza

  • Lara disse:

    ….

  • Italo Costermani disse:

    Eu não me sinto cultuando a tristeza, mas eu amo o meu jeito melancólico de ser.
    Eu me sinto mais livre afinal, me sinto desprendido das necessidades das outras pessoas.
    Eu não sei explicar bem, mas isso faz eu não ficar ansioso para namorar e casar ou para ser rico. Não sou ávido pela alegria plena e hiperbólica e assim consigo dar mais valor ao que eu consigo, mesmo que seja pouco.
    não, não dependo de migalhas, ser feliz consigo mesmo é essencial.
    Não espero que ninguém me salve da minha melancolia, é a mesma coisa que dizer que uma galinha não deveria ter penas.

    Gostaria que outras pessoas lessem isso.

  • Nana Araujo disse:

    Maravilhoso! Que texto lindo! Me trouxe um abraço