A última palavra é sempre dita pela paixão

“Agora chega! Eu quero uma mulher que realmente combine comigo em tudo e para isso, ela terá que gostar de temaki, Rock’n Roll e cinema argentino”.

Uma semana depois de eu ter proclamado essa frase imperativa, em meio ao boteco abarrotado de cinéfilos barbados, tentando quem sabe assumir o controle sobre as variáveis imprevisíveis do meu futuro relacionamento, eu já estava com ela, uma apreciadora nata das músicas do Michel Teló e, justamente graças a essa portadora de um chapéu estranho, me vi sorrindo sem conseguir parar, sentado no aconchego cimentado da sarjeta, devorando um dogão motherfucker épico e com uma camada considerável de purê de batata grudado na ponta do meu nariz. Pior, eu já estava sem nenhum resquício de voz, pois tinha acabado de sair de um show do Chitãzinho & Xororó e em meio a calças jeans vestidas a vácuo e botinas pontiagudas, assumo: doei cada centímetro das minhas desafinadas cordas vocais em prol do mais visceral e estridente cover da música “Evidências”, já cantado em espaço indoor.

Não foi apenas a essa excursão sertaneja que meu coração faminto incentivou-me a ir. Para estar perto de alguém especial, já troquei minha religiosa e rotineira ida ao bendito boteco, por arriscados desbravamentos em baladas claustrofóbicas, nas quais eu bravamente tive que digladiar com homens bíceps, em busca de uma mísera “vodkinha” no bar lotado. Não foi só isso que fiz pela tal da química e da pele. Uma vez fui convencido por uma bióloga “coxuda” a fazer uma viagem, que claramente ia contra todos os princípios básicos do conforto e segurança humano e lá, no meio da selva, mesmo estando em minoria em relações aos mosquitos gigantes que pareciam ter saído dos filmes de horror e esperando que uma onça nos devorasse a qualquer momento, fui feliz pra caralho e aprendi uma grande lição: compreendi que a importância do cenário é inversamente proporcional ao desempenho do protagonista, ou seja, um quarto pequeno, vazio e sem nenhum móvel, pode ser perfeito se compartilhado com alguém especial, já uma mansão equipada com tudo, até com montanha-russa, pode se tornar um tédio, se dividida com qualquer um.

A paixão de verdade é isso, um sentimento altamente contagioso e inflamatório, capaz de colocar crenças, raças, crédulos, línguas e gostos diferentes em harmonia perfeita, fazer com eles uma dança sinérgica em cima da mesma cama, um ritmo sublime, afinado e em busca do mesmo fim ofegante.

A paixão não mistura apenas fluídos, saliva e suor, mas também funde hábitos que antes pareciam impossíveis de coexistir no mesmo cômodo, ensina a ceder diante daquilo que nem suportávamos e dilui os mais sólidos preconceitos. A paixão equaliza as pessoas, nivela os passos e, só assim, permite que haja fusão perfeita entre peças completamente opostas, mesmo que uma delas more no pólo sul e outra no pólo norte.

A verdade é que a paixão faz com que os maiores programas de índio tornem-se as lembranças mais “fodásticas”, só depende da companhia. Isso mesmo, com uma pessoa pela qual seu coração dispara, dá até para ir ao Simba Safari mantendo o brilho nos olhos, a calma, e rir sem pressa, enquanto aqueles macaquinhos endiabrados e cleptomaníacos arrancam o limpador de pára-brisas do seu carro e despedem-se de você mostrando o símio dedo do meio.

Você pode tentar escolher o futuro, driblar o acaso e filtrar as pessoas que atravessam sua vida, mas não adianta, não tem jeito, pois no fim das contas a última palavra é sempre dita pela paixão.

Comentar sobre A última palavra é sempre dita pela paixão