Eu preciso ir, mas não me faz dizer adeus

Hoje, enquanto caminhávamos pelo parque, ela me perguntou se eu iria sentir saudade. E, em silêncio, me perguntei: como eu não sentiria? Ainda mais eu, que, entre tantos sofrimentos e euforias, sei tão bem o que é sentir saudade. Os meus melhores momentos são feitos de saudades. Os meus melhores amores são saudades que escrevo e descrevo até hoje. Um café, um pão na chapa e meia dose de saudade, por favor. Se é isso que ela quer saber, claro que irei sentir saudade, vontade de beijá-la sempre que a ver e de correr por aí de meias a carregando no colo – algo normal para nós, loucos de plantão.

Escrevendo este texto a deixo saber que estou triste e com uma saudade de um tamanho que não cabe em mim. Acontece que eu não tenho mais idade para mascarar os meus reais sentimentos. Eu quero que ela saiba que assim estou, não para criar um estado melancólico nela, nem a fazer sofrer ao saber que estou cabisbaixo, mas para ela saber que a história que vivemos foi linda para os dois lados da moeda; da cama; do coração. É bonito e sincero quando os dois deixam claro que estão sofrendo, ninguém é tão superior assim para fingir que está bem do verão à primavera. E essa é a verdade: pessoas imaturas dizem não sofrer, pessoas maduras sofrem com consciência do momento vivido.

Sinceramente, espero que ela não ache que estou dizendo adeus pois não tenho vontade de ficar. É difícil ir embora quando eu sei que, ao dormir, ela me liga com aquela voz de cobertura de caramelo. É difícil ir embora quando eu sei que ela tem asas do tamanho mundo. É difícil ir embora quando sei que ela arrancou de mim sentimentos que Machado, ou Alencar, levariam dias para descrever. É difícil ir embora, mas é tão preciso, tão necessário, é tão ciclo da vida. Acontece que saber parar de dar corda para um barco que, certamente, irá fundar, não é medo ou falta de coragem, mas maturidade. Às vezes, com os traumas e rupturas, a relação, lamentavelmente, deixa de ser pluma e vira bomba relógio; logo mais, logo menos, alguém irá morrer tentando desarmá-la. E, para variar, provavelmente sou quem morre ao final.

Nesse meio tempo em que ela ficou atrás da cortina, nunca me disse o que sentia. Brincou de passear no meu interior e não aproveitou os melhores brinquedos do meu parque. De peito aberto fui para-raios das suas ideias loucas. Sofri junto, conversei, me coloquei ao seu lado como uma caixinha de música que sempre está a cantar, me fiz companhia independente do horário, do medo ou da temperatura. Fui. Voltei. Esperei. Senti. Ri. Vivi. Compreendi. Me desdobrei em pedaços que nem sei se se encaixam mais, dividi as minhas verdades, o meu mundo, os meus sentimentos… Mas não foi o suficiente; na verdade talvez nunca tenha sido.

A gente sabe que é hora de ir embora quando, mesmo sem intenções, aquela pessoa nos tira a autoestima, nos faz perder o brilho que tínhamos nos olhos, na alma. E, mesmo quando ouvimos do outro que devemos ficar, a gente, no fundo, bem no fundo, sabe que não é mais bem-vindo naquele coração. Os sentimentos que existiam, hoje, não são mais eufóricos… são cômodos, são tom pastel. Aquele coração que um dia abraçou o nosso, infelizmente, não é mais o mesmo. É só um coração que diz, promete, gostar de você, mas, sei lá, não sei, vamos vendo…

Ela foi, eu fui, a gente foi; feliz, lindos juntos, um carinho que passou, uma lembrança-sorriso das aventuras que vivemos. Mas a verdade é que o nosso beijo de hoje tem muito sofrimento envolvido para brincarmos de ir e voltar. Infelizmente, perdemos a leveza, o sabor de confiança, o riso solto feito pipa. É uma pena, mas as horas não voltam, e, as que passaram, já me criaram mágoas demais.

Hoje sei que o nosso amor não é mais uma paisagem vista em tempo real, mas um quadro com a paisagem do que se foi. Poderemos, sempre que quisermos, olhá-lo e lembrarmos o quão bonito foi o sentimento daquela paisagem; linda, só nossa, com intensidade de sol e aconchego de chuva. Essa não será somente uma cena de felicidade de um sentimento que passou, mas de um amor-paisagem que continuará lindo por tempo indeterminado na moldura das nossas, tão nossas, melhores lembranças.

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