Minas Gerais é baum demais!

Eu me sinto um cidadão extremamente privilegiado. Sabe por quê? Porque eu, felizmente, tive as condições necessárias – e oportunidades – para viajar a diversos lugares do planeta. E, se tudo der certo, pretendo continuar investindo parcela considerável do meu salário em passagens aéreas, guias turísticos e comidas típicas. Ou você tem alguma sugestão melhor?

Já pisei em muitas cidades da Europa. Já demonstrei o meu “bebunhol” (espanhol de bebum) em diversos países da América Latina. Já comi hambúrgueres imensos e cheios de ketchup na terra do Tio Sam. E já tive o inenarrável prazer de caminhar por pedacinhos do Brasil que, provavelmente, nem no mapa estão.

Porém, definitivamente, existe um lugar no planeta no qual eu me sinto alegre como em nenhum outro. Quer chutar?

Não, não estou falando de Buenos Aires. Também não estou me referindo à Escócia. Londres? Lá é sensacional, mas não é de lá que falo agora.

Ok, eu desembucho: Minas Gerais.

Você já foi pra lá? Não? Então cancele tudo que tem em mente e vá agora, JÁ!

Em toda a galáxia, certamente, não existe povo mais hospitaleiro do que o mineiro. É sério! E o melhor: eles são hospitaleiros e, ao mesmo tempo, totalmente desprovidos de frescuras e de formalidades que – a meu ver – só engessam o mundo.

Se um mineiro convidar você para passar uns dias na casa dele, vá. E não se preocupe, pois em cerca de vinte minutos – no máximo! – você já vai se sentir uma local. E logo será surpreendida com uma deliciosa e robusta fatia de bolo. E depois com uma colherada de doce de leite. E com mais um “tiquim” de bolo. E obrigarão você a fazer um imenso sacrifício: terá que experimentar um “queijim” feito com muito amor. E, por fim, tomará um “cafézim” que vai restaurar a sua fé na humanidade. Difícil, né? Lá é “baum” demais da conta!

E os pontos positivos não param por aí, porque lá – dois pães de queijo depois – você fará amigos para a vida toda. Quando eu vou pra lá, antes de um abraço sincero e de um tapinha bem-nutrido nas costas, eles sempre me perguntam: “Como é que ‘ocê’ tá, Cardim?”. Depois disso, existe alguma chance de eu dizer que estou mal? E se, por acaso ou traição, eu disser que estou “na bad” e ameaçar começar um “mimimi”, eles logo encherão o meu copo de cachaça, e, à base de álcool e bom papo, farão com que eu fique “baum”. E se eu disser que estou bem? Aí eles encherão o meu copo de cachaça, e, à base de álcool e bom papo, farão com que eu fique “baum” pra mais de metro. Não é genial?

Lá em Minas, qualquer acontecimento – de pernilongo assassinado a pedido de casamento – é o motivo perfeito para motivar uma comemoração. Funciona assim: “Cardim, como ‘cê’ tá? Só passei aqui pra avisar que vamos queimar uma carninha na casa do Sandrim mais tarde. Espero ‘ocê’ lá, paulistinha!”. “Pode deixar. É algum tipo de comemoração?”. “É sim, a cadelinha do Carlim pariu uma porção de ‘fiotim’. Ocê precisa ver quando ‘bichim’ ‘bonitim’. Tudo ‘peladim’ e ‘branquim’!”.

Até enterro de mineiro é divertido. Não estou brincando. Do nada alguém se lembra – em voz alta – das hemorroidas do falecido, e as lágrimas logo dão espaço às gargalhadas. E as gargalhadas rapidamente motivam um: “O que ‘ocês’ acham de uma ‘pingaiada’ na casa do Celsim? Aposto que o Junim, se estivesse vivo, toparia!”.

Diferente de São Paulo, onde tudo acaba em pizza – ou em uma desculpa motivada pela preguiça (“Véio, não vou conseguir aparecer. Sabe como é o trânsito, né?”) -, em Minas as coisas sempre terminam em “churrasquim” e cerveja gelada. Tem desfecho melhor?

Outra coisa: o mineiro realmente está disposto a gastar energias para agradar a visita e fazer com que ela volte mais vezes. Como eu sei? Certa vez, a uma simpática senhora mineira, eu confessei que sou apaixonado por jabuticaba. Resultado: voltei a São Paulo com a mala cheia de potes de geleia de jabuticaba. Se eu dissesse isso aqui, em São Paulo, no máximo eu ouviria um “Você já foi ao Santa Geleia? Fica nos Jardins. Lá eles vendem umas geleias gourmets deliciosas. E sem açúcar. Eu mandarei o endereço por e-mail para você!”.

Mais um exemplo? Em meio a um churrasco “mineirim”, eu contei ao meu tio Fernando (que só não é Fernandim porque é pai de um Fernandim) que a minha namorada não come carne vermelha. Sabe o que ele fez? Largou a churrasqueira, meteu uma minhoca no anzol e, minutos depois, apareceu sorridente e segurando uma tilápia parruda. Na mesma situação, o paulistano provavelmente começaria um debate sobre os motivos filosóficos que levam o ser humano a se tornar um vegetariano e abri mão do topo da cadeia alimentar.

O mineiro é foda. Minas Gerais é foda.

Nas padocas de lá ainda conseguimos encontrar o tal do “biscoitão”. Já ouviu falar? É como se fosse um polvilho gigante. É bem gostoso, crocante na medida certa, maior do que piroca de negão bem-dotado e, geralmente, custa menos de um real. E os lanches mineiros então? A “gourmetização” ainda não conseguiu ganhar espaço em Minas Gerais, por isso, os lanches de lá continuam imensos, deliciosos, baratos e sem frescura. E creio que, na maior parte do estado, manterão a tradição e não permitirão, por nada, que a maionese temperada ceda o lugar ao glamoroso azeite trufado.

Só sei que o estado de Minas Gerais dá um pau na Grécia e coloca Miami no chinelo. Sei, também, de outras coisas interessantes:

– O mundo tem muito a aprender com o comportamento acolhedor do povo mineiro.

– Assim como Cesar Menotti e o Fabiano, eu me tornei mineiro de coração.

– Os mineiros costumam nascer com três fígados.

– Quem sente falta de mar é peixe ou surfista, eu sinto falta de churrascos infinitos em Minas Gerais. E de ouvir um acolhedor e simpático: “Cê tá baum, Cardim?”.

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