Minha namorada cortou o cabelo curto e o mundo não acabou

por Léo Luz

Ok, eu admito, eu sou um sujeito avesso às mudanças. E isso se reflete em todas as instâncias da minha vida. Eu ainda uso o acento em “idéia”, “Coréia” ou “estréia”, ainda uso trema e ainda coloco hífen em “anti-aéreo” e em “auto-escola”. Me prendam. Eu uso brincos há vinte anos, e há vinte anos eu penso em parar de usar brincos. Nunca tive coragem. Eu uso o mesmo corte de cabelo há vinte anos. Meus móveis raramente saem do lugar, minhas roupas são sempre as mesmas – ou parecidas, quando preciso de novas – e eu uso a mesma pulseira há vinte anos também. Deu pra perceber que mudança não é comigo.

Some-se a isso que eu nunca namorei uma mulher de cabelo mais curto do que na altura do ombro. Eis que minha namorada decidiu que ia cortar o cabelo. Falou nisso por meses, e enfim foi ao cabeleireiro. Eu, no auge do meu medo de mudanças e da minha empáfia de “ah, ela não vai cortar nada, vai só me assustar”, realmente achei que ela não fosse cortar. Qual não foi a minha surpresa quando ela saiu do salão com o cabelo da altura do meu… Eu teria desmaiado se não estivéssemos em público. Mas o pior estava por vir. O meu terror por mudanças não estava preparado para o que aconteceria em seguida: eu achei lindo. Lindo, absolutamente lindo. É uma frase estranha de ouvir, mas eu, que já acho a minha namorada linda, poucas vezes a havia achado tão bonita. Além de linda, eu achei uma decisão muito autêntica e corajosa. Até nisso a imagem dela mudou, para mim. É um passo enorme para uma mulher, ou imagino que seja. Muitas mulheres não o fazem por falta de coragem. E ela teve coragem, fez, e ficou lindo. E não que a minha opinião importe, mas mudou a minha opinião sobre isso.

É óbvio que achar a minha namorada linda não me espanta nem é nenhuma novidade pra mim. A novidade é perceber que uma novidade dessa não implodiu o universo. Nada mais mudou. Nenhum terremoto. Nada de meteoro. Nada. Só o cabelo mudou, mais nada. Quando saímos do shopping, não estava chovendo sapos, não estávamos em outra dimensão nem havia marcianos escravizando a raça humana. Estava tudo no lugar. Menos o cabelo da minha namorada. E ela estava linda. Para um sujeito ansioso e cheio de tocs e manias como eu, foi uma lição dura. Cheguei em casa e decidi parar de usar brincos. Troquei os móveis do meu escritório de lugar. Vou comprar roupas novas. Vou mudar a barba. Mas não vou parar de andar com a minha moeda da sorte no bolso. Vai que é ela que mantém o universo no lugar.

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