Quem nunca foi a garota do canto?

A garota do canto espera a sua vez, não por educação, nem por paciência; espera porque espera. Espera porque não aprendeu a se levantar.

A garota do canto gosta de tomar chuva, mas desconhece que gosta. A garota do canto jamais se perguntou sobre o que gosta. Nunca publicou um texto do seu diário. A garota do canto é tom pastel. É uma música que não faria tanta diferença. É a sessão de cinema, seguida de pizzaria e nada para dizer a respeito do filme. É vampira, sem reflexo no espelho.

A garota do canto não aperta o play, o stop, está em constante pause – e tudo bem. Não sabe se vai pra direita ou pra baixo. A garota do canto é quarto. É água de café passado há quatro horas. A garota do canto é o que restou de uma vela queimada.

A garota do canto não é sim, não é não: é talvez. É um cochicho que ninguém entendeu. A garota do canto é chuchu e implora para que não a temperem. A garota do canto é só um número na chamada da escola. É o pão esquecido em cima da mesa. Ela é ausência de barulho – nem silêncio – ausência de barulho. Você tropeça na garota do canto e nem percebe. A garota do canto não tem nome.

A garota do canto acha que uma mensagem, que demora pra ser respondida, só pode significar desinteresse e assim passa a vida focada no desinteresse. A garota do canto é exatamente como essa mensagem que demora pra ser respondida.

A garota do canto se esvai das histórias. A garota do canto, aliás, não precisa estar em histórias, porque ela não inventa histórias – nem a sua. A garota do canto não respira – para não atrapalhar. A garota do canto se desculpa mesmo sem ofender. A garota do canto não sabe se existe aqui. E se existe, apenas resiste. Há um pouco da garota do canto em todas nós.

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