Eu descobri que ele me traía
Tá foda. Ainda não são nem nove horas e eu já bebi meia garrafa de gin. Liguei pra ele desesperada e desliguei antes de atender porque ainda não ensaiei as palavras chulas que vão fazê-lo morrer em mim. Liguei pra minha irmã e ela não atendeu. Entendi que era um sinal. Saquei que quem vai ter superar essa merda sou eu. Enxuguei minha cara molhada, dei dois tragos num Marlboro vermelho e apaguei com o pé direito porque de coisa que faz mal eu já tô legal. Parece que tudo que há de ruim já está aqui. Bem aqui dentro. Morando em mim e me fazendo mal.
Eu não esperava. Acho que ninguém espera na real. A gente desconfia. Sente. Fareja. Saca, mas não espera. A verdade é que esperar me lembra esperança e sempre me disseram que esperança nunca faz mal.
Em algum lugar eu já sabia. Sabia e insistia em não saber porque pra quem não sabe é bem mais fácil superar. Mas chega uma hora que a realidade te estapeia. Ela se escancara. Ela te chama de idiota com dois tapinhas no maxilar e logo cobra: “E aí, minha filha, não vai acordar?”.
Acordei mas tá foda. Tá foda aceitar. Tá foda porque meu primeiro impulso, confesso, foi pensar em perdoar. A grande merda da traição é essa: a gente fica sabendo e os sentimentos não se vão de supetão. Eles são idiotas. Eles insistem. Eles persistem. Não têm amor próprio. Eles travam uma guerra horrível com a timidez da razão.
Eu sempre achei que não há coisa mais canalha que a traição. Sacanear quem te ama não é vacilo. É golpe baixo. É agressão. Não vou relevar tudo isso e entrar contradição. Não vou perdoar porque não tenho motivos pra isso. Eu sou forte. Eu sou ótima mesmo depois dessa garrafa de gin que embaralha minha visão. Sou tão forte que não faz sentido me rodear de gente fraca e incapaz de cumprir os acordos feitos embebidos em paixão.
Eu sou teimosa. Eu ainda acredito na lealdade porque sou prova empírica de que fidelidade não é nenhum desafio quando se tem empatia e compaixão. Eu insisto no amor porque hoje eu já tive uma overdose de coisas ruins e logo devo vomitar esse cara, esse gin e toda a raiva que eles fizeram brotar em mim.
Voilà. Corroeu. Ardeu. Doeu, mas eles não existem mais em mim.
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