Miss Universo – Mulheres para (auto)consumo?
Tudo bem que ele está longe de esbanjar o mesmo glamour que tinha nos anos 50 e 60, mas ainda assim o Miss Universo atrai uma porção de espectadores. Entre eles, está a autora deste texto que acompanhou a transmissão do concurso, encerrada na madrugada desta quinta-feira com a coroação da estadunidense Olivia Culpo.
Curiosamente, antes de descobrir que o evento estava sendo veiculado na TV, me encontrava diante do computador, produzindo um texto para o blog no qual falava sobre a relação entre beleza e consumismo. Um vínculo que, ao meu ver, é comprovado e alimentado pela enxurrada de “matérias jornalísticas” que apresentam e reforçam tendências de corpos próprios ou impróprios para o consumo. Consumo?! Sim, foi exatamente isto que quis dizer, afinal no fim das contas tudo gira em torno do desejo de conquistar as curvas, a aceitação, a beleza e o prestígio de musas midiáticas e celebridades.
É justamente esta necessidade que movimenta a indústria de beleza do Brasil (hoje, apontada como a terceira maior do mundo) e leva vários portais de notícias a publicarem este tipo de conteúdo na tentativa de atrair rapazes ávidos por beldades para serem “homenageadas” em seus devaneios particulares e, é claro, mulheres em busca de referências. O que muda – e muito pouco, por sinal – é a forma de apresentar este tipo de informação. Ora, ela aparece embutida em entrevistas que giram em torno da dieta do momento e de lindas moças cadavéricas. Daqui a pouco, está presente em cliques indiscretos ou made in Instagram que mostram roteiro de malhação em academia, looks fashionistas ou uma pose sexy feita para a lente do celular. Isto sem falar nas moças que propagam a quatro ventos pormenores da última maratona de cirurgias plásticas, com direito a uma série de comentários esdrúxulos sobre “retoques íntimos”.
Pois bem, alimentada de todas estas idéias, fui assistir ao concurso, adotando uma postura mais defensiva, avessa a todo este consumismo em torno da figura de nós, mulheres. Já esperava, por exemplo, me deparar com desfile de trajes que oscilam entre o belo, o cafona e o bizarro, mulheres muito magras (a exemplo da candidata do Líbano) e perguntas genéricas que exigem respostas não menos clichês, forçadas e politicamente corretas. Confesso que logo nos primeiros instantes diante da tela, só conseguia pensar naquela célebre sequência de Another brick in the wall do Pink Floyd, no qual as crianças entram marchando em uma máquina e saem todas mascaradas, sem identidade e terminam como carne de segunda. Em vez dos pequenos, via várias Barbies andando de um lado para o outro.
O que de fato me surpreendeu foi o desfecho da competição: a coroa não havia ficado com a eloqüente filipina, nem com a bela e cotadíssima brasileira ou com a descolada Miss Venezuela. O topo do pódio foi ocupado pela representante dos Estados Unidos, a única do torneio não atingir a marca de 1,70m de altura. Ao saber do veredicto, torci o nariz – confesso! No entanto, logo depois, ao procurar saber sobre a tal vencedora mudei de opinião.
Enxerguei uma candidata que é gente como a gente. Uma mulher que, além de “baixinha” – em aspas sim, porque ela é alta em relação aos meus modestos 1,55 cm– não tem o mesmo busto das adversárias e nem por isso se viu na obrigação de recorrer ao silicone. Já chegou inclusive a se atrapalhar com os enchimentos colocados estrategicamente no sutiã para dar uma valorizada, sendo clicada com eles à mostra. Sim, acho esta sutileza um diferencial, ainda mais em uma época regida pela máxima da Barbie Girl que prega que “a vida no plástico é fantástica”. Para se ter uma noção, no Miss Brasil de 2011, apenas 5% das candidatas não haviam sido submetidas a uma cirurgia.
Outro aspecto que me chamou a atenção foi o fato de Olivia seguir uma linha totalmente diferente das demais, apostando em um modelo todo pomposo sem fendas e transparências – uma referência clara a Audrey Hepburn, que influencia o trabalho da modelo. Esta linha afetiva também foi mantida na hora de responder as perguntas, quando a candidata falou sobre os irmãos. Na hora, até eu que sou sentimental até o último fio de cabelo achei brega, mas depois fiquei pensei até que ponto isto não serviu para humanizar um pouco aquela mulher que está ali, sendo assistida por milhões de espectadores e submetida a uma edição que faz com ela seja taxada como um monumento idiota.
Talvez seja sinal de uma tomada de consciência de que nós mulheres devemos ser mais humanas e apostar menos em construções excessivamente artificiais, até porque, na prática, ser natural é muito mais sedutor para eles
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