O amor me persegue
Sempre andei me escondendo do amor. Fugindo de encontros à dois, de olhinhos nipônicos e de canções dos Los Hermanos. Me escondia atrás deste rosto cansado, de LPs antigos e de meias pretas inseparáveis. Recolhia-me em mim, evitando aquelas festas alternativas, recheada de meninas com Ray Ban de grau, saias longas e sorrisos largos. Para mim, estava bom ser acompanhado apenas por meus vinhos, meus livros, minhas chateações e meus bonecos decorativos.
O amor me persegue como quem precisa me vencer de alguma forma. Aparece numa praia que fui porque estava sem sol ou numa fila do banco sem graça em dia de pagamento. O amor se engrandece em minha frente com aqueles casais que se beijam e parecem gritar na minha cara como é bom amar. Ou aqueles pseudo-felizes pares, despojando falsos sentimentos em redes sociais. As pessoas me chamam de taciturno. É, talvez eu seja.
Mas prefiro minha casa sem cheiros femininos que não me deixam dormir em noites de segunda. Prefiro ter minhas próprias trilhas musicais, sem nenhuma canção específica que me faça sorrir como um pré-adolescente ao lembrar de uma dança qualquer sob a chuva. Prefiro minhas meias e cuecas espalhadas pelo chão sem ter que esbarrar por nada de rendinha ou bordado esquecido de outrora.
Mas ai, ela me apareceu de surpresa com um sorriso talhado capaz de deixar qualquer exército americano desarmado. Passou e nem me olhou. Mas me ganhou com aqueles ombros finos e com aquele cabelo liso ao vento. Me escondi, é claro. Ou melhor, tentei. Abaixei os meus olhos e procurei pensar em algo ruim, como alguém tentando evitar um orgasmo. Não consegui. Ela falou algum blá-blá-bla que me soou um como uma poesia do Augusto dos Anjos e meus finais de semana de leitura sozinho acabaram. E hoje eu até cantarolo: ‘O amor me pegou’ em meus dias de trânsito
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