Ser intenso, não é tão legal quanto dizem por aí
Quem vive entre dois extremos, sabe que isso não é bom, na maioria das vezes. Água tem que ser fria ou quente, se for morna, não serve pra fazer chimarrão, nem tereré. O maniqueísmo¹ que habita por dentro da pele de uma pessoa intensa, faz com que ela precise de estímulos mais fortes para que continue sentindo qualquer coisa por fora. Entre amor e ódio, prazer e dor, biscoito e bolacha, nada é compartilhado de qualquer jeito. Quando eu tinha 8 anos, lembro de ter ouvido da minha professora do colégio a seguinte frase, antes de uma apresentação da turma:
– Se for aplaudir alguém, bata palmas até as mãos formigarem, com força. Caso contrário, não se dê ao trabalho de celebrar algo que não te estimula.
O tempo passou, e eu cresci com esse estigma de intensidade, acreditando piamente que mergulhar de cabeça em tudo aquilo que escolhi fazer parte, era e melhor maneira de me sentir vivo. Acho que levei alguns anos pra entender que nem todo mundo era igual a mim, e muitas vezes morri afogado nas minhas próprias expectativas.
Namoros, amigos, empregos e família, todos os campos do relacionamento humano, se transformavam em verdadeiros campos de guerra, em que a vitória era a única opção possível, fosse pelo cansaço ou pela satisfação da conquista. De algum modo, esse “entusiasmo” se transformou em egoísmo e ansiedade, alimentando meus medos e inseguranças diariamente, até o ponto em que estes monstrinhos acabaram se tornando muito maiores do eu. Por consequência acabei desenvolvendo hipocondria, síndrome do pânico, gastrite nervosa, e uma série de complicações para conseguir perceber que estava totalmente perdido, e só aí resolver procurar ajuda.
Foram meses de psicanálise para preencher lacunas que nem eu sabia que tinha. Traumas de infância, carência afetiva, sexualidade, cobranças internas, com o corpo e com a carreira, além de uma série de perguntas das quais nunca tive coragem de fazer para mim mesmo, e responder de maneira racional, levando em conta as consequências que nunca fiz questão de medir. Precisei voltar atrás, refazer o caminho da minha vida e cuidar de machucados que havia deixado abertos até ali, para poder seguir em frente, sem medo de cair de novo.
Minha euforia continua aqui, vivinha da silva, acredita? Só que um jeito diferente. Hoje consigo entender que ela faz parte de mim e não o contrário, claro que ainda perco a paciência, até porque nunca tive muita mesmo, mas a razão, essa eu faço questão de carregar debaixo de braço.
Aceitar minha essência e conhecer meus limites, me fez entender que não posso passar por cima de coisas que julgo importantes. Fazer isso, seria o mesmo que me atirar em um poço escuro e incerto, do qual eu iria demorar demais para sair de dentro. Não vale à pena exigir de mim mais esforço, além daquele que sei que consigo suportar Ouça, bem como não posso, e não devo, cobrar dos outros as minhas próprias contas, porque mais cedo ou mais tarde, a vida vai me dar o troco na mesma moeda.
Maniqueísmo¹: É a ideia baseada numa doutrina religiosa que afirma existir o dualismo entre dois princípios opostos, normalmente o bem e o mal.
[…] Autor: José Lúcio dos Santos Fonte: eoh.com.br […]