Só os inteligentes assumem o que não sabem
A vergonha de assumir os naturais desconhecimentos, geralmente, começa na escola. Na classe de aula, o professor – após confeccionar uma explicação detalhada – pergunta: “Alguma dúvida?”. E, mesmo os alunos que não entenderam nada do que foi escrito na lousa, contaminados pela falta de reação generalizada e pelo medo de serem rotulados como os burros da turma, calam-se e, consequentemente, voltam para casa sem saber aquilo que saberiam se apenas tivessem dito: “Não entendi, Amado Mestre. O senhor, por favor, pode me explicar novamente?”.
Alguém precisa levantar a mão para mostrar aos envergonhados que admitir – internamente ou até publicamente – o desconhecimento, sem dúvida, é o primeiro passo rumo ao conhecimento. Alguém precisa erguer o braço para mostrar às estátuas congeladas pela timidez que desconhecer não é demérito ou característica negativa. Porém, comumente, todos da classe vestem a máscara do silêncio e assim, sem perceber, dificultam ainda mais a atitude daquele que pensa em – com palavras sinceras – reconhecer que não entendeu bulhufas do que foi ensinado. “Se todo mundo entendeu, ao levantar a mão, eu demonstrarei burrice e inferioridade!”, pensa, erroneamente, o ser com medo de ser visto como o “patinho burro” da turma. Mas não é bem assim, meu caro. Levantar a mão é sinônimo de inteligência e demonstração clara de disposição para evoluir. Não percebe? Os caras mais inteligentes que eu conheço têm uma característica em comum: eles nunca perdem uma chance de aprender algo novo. Como eles fazem isso? Simples! Eles não têm a mínima vergonha de dizer que não sabem e de pedir para que alguém os ensine.
E o desnecessário embaraço na hora de demonstrar desconhecimento, infelizmente, não finda na escola. Quer um exemplo? Em uma roda de amigos, alguém diz: “Isso me lembra do último filme do Woody Allen. Não acham?”. E todos – mesmo aqueles que não fazem ideia de qual foi o último filme do Woody – concordam. Todos – mesmo os curiosos para saber qual foi a última obra dirigida pelo baixinho de óculos de lentes grossas – dizem “sim” e perdem a excelente oportunidade de preencher a mente com uma nova informação. Qual o problema de perguntar algo como: “Qual foi o último filme feito pelo Woody Allen?”. Nenhum! Muitos até questionariam, mas começariam a frase com a seguinte afirmação falsa: “Desculpe-me pela ignorância, mas…”. A afirmação é falsa, pois dizer “eu não sei” nunca é sinônimo de ignorância. Ignorância, de verdade, é perder uma oportunidade de saber.
Em meu primeiro emprego, pediram-me para mandar um fax. E eu – por ser de uma geração que pouco utilizou tal ferramenta – não sabia. O que eu fiz? Demorei mais de um dia para – com voz mole e bochechas rubras – conseguir a coragem necessária para pedir ajuda a alguém. E sabe o pior? A pessoa que eu escolhi para me auxiliar, ao ouvir meu sincero pedido, perguntou-me: “De qual planeta você é?”. A vergonha ficou ainda maior. Entretanto, a suposta sabichona se esqueceu de que ela – apesar de dominar os mecanismos do fax – não dominava outros assuntos nos quais eu era expert. Eu podia ter simplesmente contra-atacado e dito: “Ok, X-Sabedoria, então me explique, sem gaguejar, o que é uma fosseta loreal (orifício localizado entre as narinas e os olhos da maioria – com exceção da cobra-coral-verdadeira – das serpentes peçonhentas encontradas em território brasileiro)!” Porém, eu fiquei quieto e deixei que ela queimasse o próprio filme enquanto tentava, burramente, demonstrar sabedoria tentando ridicularizar o meu desconhecimento.
Hoje, sem medo e até com certo orgulho, afirmo: “Eu não sei!”. “Você sabe chegar ao centro da cidade?”, falam para tentar me ajudar e eu – por total ciência do meu desconhecimento e vontade de aprender – respondo: “Não tenho nem ideia. Como eu faço para chegar lá?”. “Sabe aquele ator que fez aquele filme do cachorro que morre no final?”, perguntam-me e eu – com pavor de perder a chance de aprender e sem medo de ser o único na roda a não saber – respondo: “Não, quem é? Mostre-me, por favor!”.
“Só sei que nada sei”, com certeza, é o lema daquele que – apesar de saber muito – sabe, também, que assumir as trevas da ignorância é o melhor caminho para conhecer a luz da sabedoria.