Sou politicamente inseguro, e agora?
Com o inicio da Copa, fui percebendo muita gente que apoiava a não realização do evento no Brasil mudando de ideia e tentando se justificar nas Redes Sociais. Criou-se uma interrogação e vários tipos de comportamento foram se desenhando: intelectuais tentando criar teorias infalíveis pra num pegar mal, gente que simplesmente pulou a parte de se explicar, ou os que bateram o pé e continuaram boicotando a copa.
Sou do tipo que acha extremamente necessária a discussão política – civilizada – em espaços virtuais. A impressão que eu tenho, é de que o ângulo em que enxergamos as pessoas mais politizadas funciona mais ou menos como a edição de uma novela: ninguém tem olheira, ninguém vai ao banheiro, ninguém se esquece de trancar o carro, é como se todos tivessem nascido com informações políticas mentais privilegiadas, sem que exista a dúvida, a insegurança, a transição. Minha construção política, por exemplo, está em constante desenvolvimento, e eu a enxergo como algo inacabável.
Hoje, minhas direções opinativas movem-se a partir de leituras de blogs, compartilhamentos de amigos e postagens coerentes. Eu cresci em família de classe média, que deixava o canal cinco ligado, mesmo sem ninguém assistindo, fiz universidade pública e vivi situações de greve, ocupações, discussões, e talvez por ter feito parte da atlética, acabei desenvolvendo uma relação de amor e ódio com diretórios acadêmicos. A partir dessa época eu já sabia muito sobre o que eu não queria ser. Não, eu definitivamente não queria ser um reacionário – e saber o que é ser reacionário, na minha cabeça já era um status básico de entendimento político, uma vez que um reacionário normalmente não sabe que ele é isso, não sabe nem o que isso significa.
Com a interatividade do Facebook, fui lapidando com mais facilidade na minha cabeça, o que significava ser de direita e de esquerda, e eu tirava essas conclusões a partir de algo muito simples: sempre que um assunto entrava em pauta, as mesmas pessoas posicionavam-se nos mesmos blocos opinativos. Fui então criando um mapa ideológico na minha mente – e não quero que vocês o encarem como uma pedante generalização, como eu disse anteriormente, esses são apenas os blocos que criei na minha cabeça.
Um lado tem uma face politicamente correta, defende o bolsa-família, as cotas negras em universidades, alternativas de mobilidade mais acessíveis a todos, a descriminalização da maconha, a legitimidade das greves, são contra correntes preconceituosas de ordem machista, elitista, homofóbica, racista ou de opressão religiosa. Costumam chamar os membros de outro pólo de “coxinhas”, “reaças”, “alienados” ou “tucanos”.
O outro polo geralmente tem ideias mais conservadoras, rígidas, progressistas, liberais, tratam movimentos sindicais como coisa de gente “vagabunda”, acham que o bolsa-família é uma esmola do governo atual, que incentiva os pobres a terem mais filhos, possuem anseios mais elitistas, valorizam a esfera privada. São geralmente defensores do politicamente incorreto, de uma liberdade de expressão sem muito limite, em que agredir o outro, tirar sarro de minorias, é justificável simplesmente pela sobrevivência do humor, e que o contrário disso é simplesmente um embargo ao direito de opinião. Possuem um campo de interesse que favorece a um nicho específico, geralmente a classe média, suas vontades individuais e seus “banheiros de empregada”. Costumam chamar os membros do outro polo de “Petistas”, “PeTralhas”, “Comunistas” ou “vândalos”.
Chego agora no ponto que eu queria: às vezes, me sinto inadequado a esses polos, justamente porque discordo dessas obrigações binárias, da necessidade de ser de um ou de outro rigidamente. Tenho diversas ideias alienadas que foram se impregnando em mim, e muitas ainda ecoam nas minhas irritações superficiais, como por exemplo, ficar três horas no trânsito pra chegar em casa e xingar uma greve em pensamento apenas por um transtorno individual. O fato é que eu sempre me senti um híbrido político: era como se eu sempre tivesse uma postura esquerdista na direita, ou de direitista na esquerda. E nem sei até que ponto isso é bom, já que me sinto desconfortável moralmente quando tenho uma postura conservadora sobre as coisas, e se pensarmos racionalmente, na matemática, na junção entre menos e mais, prevalece o menos. Não suporto intolerância, mas também tenho ressalvas com fanatismos. Tenho problemas inclusive com o mapa descrito acima, embora ele seja uma construção minha, eu não necessariamente concordo com as configurações dele, afinal, existe muita gente de direita que não humilha o garçom e muita gente de esquerda que não concorda em descriminalizar a maconha. Acho que ponderação política não é apenas pensar, é pensar sobre o que você pensa.
Não acho que partido é time de futebol, acho sim que a existência partidária contribuiu de maneira definitiva para todas as conquistas enquanto sociedade, e eu defendo a existência deles inclusive em manifestações, mas eu ainda prefiro votar em candidatos, a fechar os olhos para condutas lamentáveis dos nossos dois partidos principais. Outra coisa que me incomoda é o exagero de vigília, alguns patrulheiros exigindo mudanças no mundo que nem eles praticam, e eu enxergo neles dois tipos de comportamento: existem os que oprimem a opressão, e acho esses “intrometidos” completamente necessários ao nosso ideário social porque eles regulam e combatem injustiças informais que reforçam preconceitos ou fascismos, mas existem os que ficam caçando contradições dos outros, que querem puxar briga em caixas de comentários apenas pelo prazer de serem do contra, ou por acharem que só eles sabem o que é melhor pro mundo, e eu sempre defendo que não existe coerência no ser humano, somos feitos de vontades, e às vezes elas nos atropelam ideologicamente, o paradoxo é da nossa natureza, mas admitindo que esse paradoxo exista, como posso eu, sair por aí apontando e elegendo quem, dentro dos meus critérios, é coxinha?
Outra coisa bem comum é a arrogância intelectual: gente que defende muito uma ideia minoritária e que quando percebe que convenceu um alienado sobre a sua tese, passa a oprimi-lo para se desidentificar daquela pessoa. É como se você tivesse que concordar comigo, mas não pudesse estar do mesmo lado que eu, quase como uma lógica “hipster política”, de que se aquilo virou um consenso, é hora de abandonar o barco e inventar uma nova moda, só para me mostrar um sagaz veterano político. Toda essa carga em cima do tímido político acaba culminando em um encolhimento moral por parte dele, ou muitas vezes um medo de desagradar alguma pessoa próxima, e essa elipse vira uma zona confortável, em que é mais fácil não opinar ao invés de entrar num tiroteio em que o meu revólver informativo esta carente de munição e eu ainda corro o risco de perder a credibilidade com pessoas que gosto.
Entrando na parte de insegurança, quero dizer que eu não sou uma pessoa que lê assiduamente tudo sobre política, e acho que exercer política envolve bom senso, e MUITA informação. Sinto que tenho apenas o primeiro, e isso me serve de consolo na hora de fazer escolhas. Minhas opiniões sempre se constroem a partir das ideias que um seleto conjunto de amigos, colegas, escritores, jornalistas que considero sensatos expõem. E munido disso, eu opino, curto, comento, concordo e discordo. O que eu posso dizer é que o meu partido são os meus amigos, e as pessoas que confio, e é por aí que começa a construção da minha opinião, e consequentemente de uma sinopse que diz muito sobre quem sou eu. Nunca vou me esquecer de um amigo que tinha extrema influência na minha forma de pensar e que me disse um dia que o seu partido político era sempre a oposição, era se colocar como fiscal do governo que está no poder. E eu realmente acho que todo mundo que vota, deveria minimamente se interessar por política, lembrando que nela, não existe o tal espírito esportivo: errar é fatal por quatro anos, votar é exercer uma decisão e isso precisa ser constantemente lembrado para que não coloquemos na conta do “brasileiro” a nossa falta de consciência na hora de votar. Eu sempre ouço que “os brasileiros que não sabem votar”, mas enquanto esquecermos-nos do pronome “nós”, vamos continuar terceirizando o problema, comportando-nos como se não fosse conosco, como se os desinformados não fossemos nós, porque claro, todo mundo sabe o que faz um vereador.
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