Um ode aos contatos reais – Sobre a superficialidade das amizades na geração da tecnologia
Eu não tenho sequer a mais vaga lembrança da vida pré-tecnologia. Há quem não acredite – motivo pelo qual, por muitas vezes, eu tive que mostrar meu RG com aquela foto com cara de joelho – mas eu nasci em meados da década de noventa, quando a tecnologia já permeava as nossas relações.
Dito isto, é fácil pensar que eu não tenho referências daquela amizade cultivada na mesa do bar, na pracinha da esquina, na rua, na chuva ou na fazenda. Mas eu posso garantir que conheci os meus melhores amigos – se não todos – em situações bem reais. Com olho no olho, abraço apertado e aquele sorriso que dá pra sacar a energia na hora. Ainda bem.
Que me perdoe a geração do whatsapp – que eu também uso, e quebra um senhor galho – do facebook, instagram e coisas afins, mas não há nada que pague a sensação de conhecer alguém real.
No mundo virtual você não conhece uma pessoa. Você conhece um perfil, criado por aquela pessoa justamente com os elementos – eu diria APENAS com os elementos – que ela quer que todos conheçam. Há, ali, alguém idealizado. Embora os perfis estejam cada vez mais completos – músicas que você ouve, filmes que você assistiu, livros que você lê – quando você conhece alguém virtualmente, você não sabe se aquela pessoa fica vermelha quando ri. Se ela pede cerveja ou bebida quente. Se ela não come carne vermelha, se sai nas sextas-feiras, se dança bem, se sabe jogar buraco… Perdeu-se, enfim, o prazer de conhecer gente de verdade – e gente de verdade é o que há de bom na vida.
Obviamente, a geração das redes sociais tem os seus méritos. Você conhece mais pessoas e com mais facilidade. Você tem coragem de dizer “oi”, mesmo que do nada – coragem esta que você não teria num barzinho, por exemplo.
Costumo dizer que tudo nessa vida pode ser bom, a depender do modo como utilizamos. Tecnologia é bom. Facebook é bom. Até instagram é bom, mesmo com todas aquelas fotos de comidas e pernocas em frente a paisagens que lembram duas salsishas. É bom conhecer pessoas, pra manter o contato com quem está longe, pra dividir seus momentos e participar dos momentos de quem você ama.
O que eu não compreendo é a facilidade com que as pessoas trocam contatos com tato – na feliz expressão de Ricardo Coiro – pela tela vazia. Não compreendo como alguém tem cabeça pro whatsapp numa mesa de bar, com bons amigos, cerveja gelada e boa música. Com gente que tem tanto mais pra mostrar do que apenas ideias – como no mundo virtual.Tem o brilho no olho, o jeito de falar, de sorrir, de abraçar. Como alguém deixa de beber pra fotografar o drink, deixa de viver momentos que jamais voltarão pra fazer aquela idiotice de Chek-in. A necessidade de estar conectado é, mesmo para mim – que convivo com a tecnologia desde que me entendo por gente – incompreensível.
Mesmo nessa geração, eu não perco o prazer de ir até a casa dos meus amigos em vez de telefonar. De abraçá-los no aniversário em vez de enviar um cartão virtual. De guardar as melhores conversas pra dividir olho no olho, quando o som das gargalhadas pode se misturar, em vez de ecoar numa sala vazia de computador. Mesmo porque eu não tenho muita paciência pra digitar. No século das redes sociais eu ainda gosto de sentir a pele das pessoas, de ouvir a voz, de observar os trejeitos. Eu ainda gosto de vida de verdade: Ou tem muita gente equivocada ou eu to na geração errada.
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