Antes de você, dormir de conchinha era tortura
Às vezes, não por causa de pesadelo, fome implacável ou bexiga cheia, eu acordo bem no meio da noite. Acordo, simplesmente, porque eu preciso confessar o amor que sinto por você, e nada além. Preciso, de verdade, mas desisto de confessar; pois eu odeio interromper o seu sono pesado, e não quero, por nada, obrigar você a parar com aqueles sorrisinhos que, provavelmente, são reflexos dos seus sonhos.
Acordo, e sem se quer me desfazer do breu em que costumamos dormir, pergunto-me o que você tem que, diferente das outras, faz-me acordar assim, bem antes do Sol, só pra falar desse amor que me faz pingar poesia.
“Será que as responsáveis por esse amor-despertador são as tantas perguntas que você me faz, e que fazem com que eu me sinta bem?”, pergunto-me, já mais acostumado à escuridão e com o frio insistente dos seus pés. E apesar de adorar as vezes em que você me usa como fonte de conhecimento e para saber mais sobre os hábitos das aves de rapina, concluo que não é isso. Ou melhor, que isso não é o principal estopim para esse amor que, vez ou outra, parece até um bom motivo para insônia.
“Será que a maior culpada pelo meu amor é a sua cara redonda como uma bolacha Oreo?”, questiono-me, já capaz de enxergar o teto graças ao potencial das retinas de se adaptarem à falta de luz. E mesmo adorando o formato de rosto que você diz não gostar, por exigir cortes de cabelo específicos e ângulos arquitetados em fotos, logo concluo que não é isso que funciona como o principal estopim para um sentimento que, sem qualquer esforço, rotineiramente acaba em crônica capaz de emocionar os meus leitores.
“Então o que é? O que me faz abrir mão do sono que sinto só para pensar no que há em você que, vira e mexe, tira-me o sono?”, interrogo-me. E apesar de nunca chegar a conclusões claras ou a motivos irrefutáveis, sinto que a causa existe, de fato. E que ela dorme com um pé para fora do edredom. Já basta, né?
Então, já conformado com a incapacidade de encontrar respostas exatas à minha dúvida, e como se pudesse transmitir todo o meu amor apenas com os lábios, beijo – sem alarde e de leve – a sua testa; e com as narinas cheias do cheiro bom do seu xampu, permito que o sono novamente me embriague. Ou será que o torpor que logo me rouba a consciência é reflexo de um amor que, além de me acordar, permite-me dormir, como eu nunca fui capaz: colado em outro corpo.
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