Entendendo o amor

Adoramos acreditar que as escolhas feitas em nome do amor vem do coração. Preciso informar algo de neurologia e anatomia humana, o coração só bombeia sangue, nada mais. A separação entre razão é emoção é mera abstração filosófica, na prática os sistemas cerebrais funcionam em conjunto, a menos que você seja um psicopata ou um deficiente que tem a cognição comprometida. A maior parte das pessoas tem razão e emoção de mãos dadas.

O fato de que não percebemos essa associação entre pensamento e sentimento não quer dizer que ela não exista. Na hora que você se deixa levar pela raiva e agride alguém diz que foi sua emoção que dominou, não foi, foi uma deliberação prévia (e racional) da sua parte que permitiu liberar a tensão física sobre outra pessoa. Se fosse um cara de 2 metros de altura você pensaria duas vezes antes de atacar. Isso mesmo, pensaria duas vezes antes de deliberar a ação, ou seja, o impulso viria a tona e você decidiria não mandar o grandão para o inferno. Mas como é sua mãe, sua mulher ou seu marido tudo bem, está em casa, não haverá consequências graves e um pedido de desculpas “resolverá” tudo.

Exatamente porque não percebemos a conexão entre pensar e sentir atribuímos muitas de nossas escolhas amorosas ao coração, quando na realidade passou por um tipo de crivo (saudável ou patológico) prévio. A pessoa preencheu certos requisitos mínimos e com isso passamos a fazer concessões até o ponto de criar intimidade, aceitar pedidos, fazer promessas, acreditar numa história legal em torno do assunto e entrar num relacionamento efetivamente.

Não gostamos de ver o amor dessa forma mecânica, mas ela é uma grande história que criamos a partir de elementos aleatórios para montar um sentido que sustente certos comportamentos. Se perguntados sobre o motivo do amor daremos uma meia dúzia de respostas para convencer nosso interlocutor, mas a realidade é que não sabemos exatamente o que nos levou a tomar aquela série de decisões. É tão real que quando terminamos o relacionamento alegamos praticamente as mesmas razões que antes eram causa de desejo.

Como não sabemos dar uma resposta plausível dizemos: “meu coração me levou a isso”. É a mesma coisa que fazemos para justificar uma compra, pois muitas vezes ignoramos uma série de fatores na hora de comprar um carro, uma casa, uma roupa e simplesmente fazemos por impulso ou para agradar alguém.

Nesse caso nós projetamos uma dimensão mais impulsiva do nosso comportamento como algo emocional e fora do controle racional. Não é verdade, apenas fazemos mais concessões a nós mesmos quando colocamos tudo no barco das “emoções”.

Quando pensamos em amor imaginamos que não temos controle sobre ele, mas como tudo o amor é fruto e causa de uma imagem mental que esconde suas raízes em múltiplos eventos e relações mentais que estabelecemos com a realidade.

Uma garota que atendi era sempre obcecada por relacionamentos nos quais precisava implorar atenção e lutar por espaço e importância. Na sua história percebemos que desde criança ela precisava implorar o amor dos pais que por conta de um divórcio mal sucedido seguiam cheios de conflitos deixando a filha sempre em décimo plano.

Quando conseguimos desvendar o enigma dessa teia de conexões internas pudemos criar novos padrões mentais e ela pôde ter relações amorosas mais lúcidas e emocionalmente proveitosas.

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