Estou de braços abertos esperando uma nova vida
Para te dizer com exatidão o local onde estou agora dentro de mim, preciso que tope fazer um exercício comigo. Imagine, por favor, o trânsito mais caótico que você já vivenciou. As buzinas, o escapamento dos carros, os vidros fechados escondendo as pessoas inquietas, insatisfeitas, atrasadas, apressadas e congeladas pelo frio artificial do ar-condicionado.
Pense também numa casa paralela à estrada. Sim, ao lado de uma grande rodovia. Ao lado do gigantesco engarrafamento. Continue a criar na sua cabeça a imagem desta casa que fica ao lado da construção de um edifício enorme. Um arranha-céu. Homens trabalhando, gritos, palavras de ordem, barulhos de britadeira, de concreto sendo feito, derramado, tijolos sendo empilhados.
Se você ainda não desistiu de entender o lugar onde estou dentro de mim, imagine que o vizinho do outro lado resolveu ouvir música alta. Mas uma música que você não suporte nenhum dos timbres, dos acordes. Que você sinta repulsa e não pode, de forma alguma, abaixar o volume.
Entendeu? Me localizou no mapa da vida? Eu preciso, agora, de um pouco de paz. Preciso, neste segundo, me mudar do local que, aparentemente, resolvi morar. No meio da contramão dos carros, ao lado dos barulhos de lares que ainda não se estabilizaram, de sons, vozes e ruídos que não são os meus. Por mais que eu saiba que viver é isso – estar em contato diariamente com aquilo que, nem de longe, gostaríamos – quero um espaço de paz. De silêncio. De calmaria.
Mas você pode e deve me perguntar – guri, como você caiu de mala e cuia dentro de uma casa no meio deste caos? Você não escolheu estar aí? Para todas essas tuas dúvidas que são minhas também, tenho uma resposta simples e confusa como tudo que ecoa dentro de mim – sim e não. Eu me permiti estar aqui, mas eu não quero continuar.
Acontece com todos nós. Nos deixamos embebedar pelo fluxo das cidades, pela correria da informação, pela necessidade da atualização, pela rapidez das notícias, pelo vibracall do smartphone. Nos deixamos embebedar pela roupa da moda, pelo vício de querer sempre algo além de tudo aquilo que já temos. E nessa corrida louca e aparentemente sem fim, entramos num loop, numa espiral, dentro de um círculo que, por não ter começo, também não tem fim. Ou melhor, podemos inventar um.
Se você topar caminhar comigo só mais um pouco, quero que imagine que nos fundos dessa minha casa tem um caminho de terra, por entre algumas árvores e plantas. Mas já aviso que não será uma caminhada simples. Esta não é uma trilha usada por muitos outros viajantes ou fugitivos dos seus próprios mundos. É que para deixar o caos que se é, é preciso muita coragem. Não é todo mundo que tem peito suficiente para bater o pé e dizer – para mim, essa vida agitada, confusa e estranha não é suficiente. Eu quero mais!
Se você ainda não entendeu para onde estamos indo, amigo, quero pedir desculpas de antemão. Eu também não sei. Mas estou ansioso para descobrir. Por hora, posso adiantar que tenho tentado seguir a minha intuição e ir para longe de todos os ruídos que me afastem de mim. Que me levem para longe da minha calma. Eu quero escolher seguir por um caminho um tanto quanto difícil que é o da paciência. Deixar para trás os interesses fúteis, as conversas fiadas, as pessoas que não sabem aonde querem chegar e quase todos os medos. Quero ir de braços abertos para uma nova vida.
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