Eu já me curei do vício dos teus olhos nos meus
Eu tenho plena consciência de que te esqueci. Esqueci e estou aqui te ligando pela última vez só pra te deixar ciente. Só pra depois você não dizer que eu não te avisei e que segui minha vida sem nem ao menos te avisar. Vai que você resolve voltar, né? Então, se quiser entrar porta adentro do meu coração, vai dar de cara com uma nova mobília e outra disposição de que ficou pra trás. Não foi só eu quem te esqueceu: minha cabeça, minha alma e meu corpo também.
Poderia até pedir desculpas pela ligação de madrugada, mas não vou. Foram tantos abusos que você cometeu que agora me sinto na obrigação de revidar alguns. Não é rancor nem ódio, só um toma-lá-dá-cá bobo que inventei aqui agora. Não estou ligando para o seu sossego, mas acho que essa informação de que te esqueci cairá como uma luva nele. Menos no seu ego, né, que gostava de ter alguém ali ainda te amando.
Engraçado isso porque eu já venho me esquecendo alguns detalhes há tempos. Esqueci do jeito que você levanta da cama e se espreguiça esticando os braços e mexendo o pescoço. Esqueci do banho de água quente e ritual shampoo-sabonete-condicionador-cremes. Nem lembro mais daquele salto alto preto com lacinho que muitas mulheres te paravam para perguntar onde tinha comprado. E, claro, esqueci completamente do seu gemido no meu ouvido quando a gente fazia amor.
Lembrança zero, é assim que vai ficar meu peito. Sem nada de você. Só pra não te encontrar querendo voltar e começar a colocar no lugar velhos porta-retratos que já guardei ou o aparelho de louça europeu que a gente ganhou de casamento. A casa está melhor sem você e pronta para receber morador novo. Alguém que queira, de verdade, se instalar na sala e fazer disso aqui tudo um lar. Que queira fazer exatamente aquilo que queria que fosse feito por você, mas que você nunca quis.
Tô te ligando só pra dizer isso. Só pra te afirmar que me curei do vício dos teus olhos nos meus e teus carinhos envolventes. Que estou limpo e não pretendo cair em tentação se houver abstinência. Eu não vou te ligar de novo nem te procurar. E ainda que alguma parte da casa me atente, vou estar sóbrio de realidade e ignorarei. E sei que não posso prever algumas ações, mas te peço que não volte aqui. Esqueça algumas coisas também: meu endereço, meus olhos, meu abraço.
E, principalmente, nunca se esqueça que eu esqueci você.
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