Limites: será mesmo necessário superá-los?

Estava lá eu e a TV ligada. Era meu primeiro contato com aquele filme, mas logo percebi quem era o mocinho daquela história comum. O herói, magistralmente penteado, não errava um tiro sequer. Tinha respostas geniais para toda pergunta e dirigia uma Ferrari de marcha ré, na contramão, enquanto transava com gêmeas estonteantes ao mesmo tempo em que desativava uma bomba nuclear, com potencial para exterminar a humanidade. Intervalo. O filme deu lugar a um comercial, no qual um homem disputava uma corrida épica contra um guepardo. Eles passaram vinte e cinco segundos equiparados, mas, no fim, o homem milagrosamente acelerou e conseguiu uma vitória mágica. Os competidores saíram da tela e deram lugar à imagem de um tênis chamado “Hero” e, logo depois, a narração de uma mensagem imperativa, que dizia: “Supere seus limites”.

Meia hora em frente à televisão foi o suficiente para que eu me sentisse um pedaço de milho barrigudo, em meio às fezes de um ser, cujo nome nem na lata de uma Coca-Cola Zero fora impresso. Pensei em colocar meu quase virgem calçado de corridas e, quem sabe, iniciar uma nova vida. Por alguns segundos, desejei ter o mesmo vigor físico daquele herói impecável e mais, quase acreditei que, para o bem do meu ser, era realmente necessário superar todos os meus limites. Mas, não. Todo aquele bombardeio de informações e aquela nítida demonstração de estereótipos invencíveis só me fizeram pensar no quanto eu precisava urgentemente parar de me cobrar tanto e, de uma vez por todas, aceitar minhas limitações humanas, minhas tantas imperfeições naturais e todo esse grupo de características, que me diferenciam das máquinas e dos personagens cinematográficos. Finalmente, percebi o quanto estava sofrendo, por não conseguir atingir metas obviamente inalcançáveis e pior: totalmente desnecessárias.

Antes, quando pensava num futuro relacionamento, incondicionalmente, desejava os mesmos closes coloridos e poses perfeitas daqueles casais Hollywoodianos e isso fazia com que toda relação parecesse incompleta. Quando almejava uma carreira profissional, me sentia o pior do pior do mundo, pois estava longe de ser um daqueles garotos prodígios, que com doze anos passa em vinte universidades e com dezoito se aposenta, após inventar algo, quase tão importante, como a roda. Quando eu desejava ter um corpo visualmente atrativo, em pouco tempo, convencia-me que só seria desejado pelas mulheres se ostentasse um abdômen à la Malvino Salvador. E, assim, sempre mirando no impossível e, consequentemente, suando sangue para no fim não atingir o alvo utópico, fui acumulando frustrações e inundando minha mochila com toneladas de cobranças, mas hoje me contento com o topo possível e deixo o impossível, como meta para o típico herói americano.

Este texto não tem o objetivo de fazer apologia à mediocridade ou fazer com que pessoas desistam de sonhos e tornem-se seres portadores de bundas obesas grudadas o dia todo num sofá cheio de farelos de biscoito. Nada disso. Apenas desejo diminuir o sofrimento desnecessário daqueles que vivem sangrando em busca da perfeição, quando, na verdade, perfeição não existe. Não entre os humanos.

O mundo não vai parar de te cobrar, infelizmente. Exigirão que tire notas sempre acima da média na escola, que bata todas as metas no trabalho, que mantenha seu pau sempre duro na cama, que sorria mesmo quando estiver triste, que se cale quando seu maior desejo é gritar, que levante quando quiser sentar e pior: exigirão que sente, quando quer dançar. Por isso, se quiser suportar as chicotadas do mundo e evitar uma parada cardíaca precoce, sugiro que guarde o fôlego, para as exigências realmente impossíveis de serem eliminadas. Não seja seu próprio carrasco. Enquanto Rocky Balboa estiver tentando superar os limites, seja sábio, aprenda a entender os seus e aceitá-los.

Esqueça aqueles vídeos motivacionais “Rocky Balboianos”. Desistir, nem sempre é coisa de covarde, pelo contrário, pode garantir sua futura vitória. Mudar os planos no meio do caminho, nem sempre é uma atitude de gente indecisa. Pode evitar imensos desastres. Mesmo que tente fazer parte do BOPE, não hesite em pedir para sair. Você, com certeza, saberá mais sobre seus limites do que qualquer Capitão Nascimento.

Não quero que desista dos seus sonhos, quero apenas que sonhe com coisas palpáveis.

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