Não morra sem ir a Amsterdã
Amsterdã é uma cidade assombrada pelas idealizações em torno de sua fama, e talvez o lado mais interessante de conhecê-la seja justamente descobrir algo dissonante em relação a essa expectativa ultrapoética colocada em cima de suas promessas postais.
Costumo dizer que a agradabilidade de um destino depende de diversos fatores e o que me interessa citar nesse texto é o fator companhia. Sou da tese de que o tipo de acompanhante influi diretamente na nossa interação com o lugar. Existem viagens que são feitas para casais, existem aquelas que pedem para que você venha sozinho, existem lugares que degustados em família rendem lembranças inesquecíveis. Amsterdã é um lugar favorável pra bagunçar com os amigos: seus atrativos, sua disposição, seu astral, tudo nos leva a um ambiente feito pro riso, passar da conta, ser maluco, é terra do BBB, de dizer “uhu” ou apenas deitar no parque e não fazer absolutamente nada. Uma amiga diz que a palavra de Amsterdam é coexistir, partindo por essa lógica, acho que é uma cidade que a todo tempo se divide entre a mansidão visual e a luxúria ofertada, cada qual disputando paisagens, hábitos, vontades.
Minha primeira surpresa foi com o centro, a muvuca, a aura roots. Me lembrou bastante os embalos da Rua 25 de Março em São Paulo, com ambulantes, sujeira, e gente tentando te vender loucuras e frituras. Por ali fica a Red Light Street, a rua em que prostitutas ficam expostas em vitrines iluminadas por lâmpadas vermelhas, e interagem com beijinhos, tchauzinhos e o mais curioso é a neutralidade das famílias passando por lá com crianças, todos olhando aquilo como um item turístico. Os famosos Cooffe Shops possuem potes divisórios que fazem alusão ao nível de efeito da maconha, vão do level “easy” ao “hard”, e nos hostels existe uma salinha temática cheia de pufs e sofás chamada de “Happy Room”.
Os poéticos canais existem, e você fica ali se imaginando em uma daquelas casas-barco, e esquece que o Rio Tietê existe. O Vondel Park é cheio de lendas, dizem que ali depois de certo horário o sexo é liberado, antes disso é um parque-piquenique. As bicicletas estão por toda parte, e isso ao extremo às vezes se torna um risco pros pedestres, lá o transporte é completamente dominado por elas – com o auxilio de trams e dos ferries. E tem a casa da Anne Frank, lugar triste e claustrofóbico, e o Museu do sexo, da tortura, do erotismo, e as degustações de queijo.
Amsterdã é uma ruiva arisca de aparência dócil. É perigosamente sedutora. Por vezes é a insanidade de um crime passional, por outras é um romance com tulipas.
Comentar sobre Não morra sem ir a Amsterdã