Não sei se é namoro ou casamento, só sei que estamos juntos e felizes
Gosto de dar nome às coisas. Você também curte? Aliás, por R$ 10,00 e uma coxinha, eu posso pensar em um nome genial – e exclusivo – para o cachorro que você está pensando em adotar. Que tal fugir um pouco da mesmice? Que tal um nome capaz de matar, de inveja, o Bob – ou a Mel – da sua vizinha? E o melhor: cachorros não vão à escola e, portanto, não precisamos nos preocupar com o bullying que um nome exótico pode desencadear na hora da chamada. E tem mais: “Pets com nomes raros vivem muito melhor!”, afirmou uma pesquisa feita por estudantes maconheiros e desocupados de uma universidade da Califórnia.
E fique sabendo que eu não trabalho somente com a nomeação de cachorros; dou nomes também a papagaios e a jabutis. Do que você está rindo? Acha que escolher o nome de um jabuti é uma tarefa fácil e sem riscos? Nada disso! Os jabutis chegam a viver mais do que 80 anos e, por isso, um nome escolhido por alguém que não pensa no futuro pode fazer com que eles se sintam ultrapassados e, consequentemente, com que caiam em depressão profunda. Conheci uma jabutizuda que começou a tomar Lexotan depois de perceber que “Filomena” já era um nome completamente fora de moda. Ela daria tudo para se chamar “Sofia” ou “Maria Eduarda”.
Dou nome também àquilo que nem vida tem. Meu carro se chama “Pablito”. Minha máquina de café atende por “Fantástica Fábrica de Suco Gummy Afrodescendente”. E a minha cueca preferida se chama “Kimono do Guerreiro”. Por esses nomes você não esperava, não é mesmo?
Porém, mesmo ciente de que sou um CCNM (criador compulsivo de nomes mirabolantes), eu tenho bom senso suficiente para achar que algumas coisas não devem, em hipótese alguma, ganhar nomes exóticos. Quais? Órgãos sexuais, por exemplo. Não existe nada mais broxante do que ouvir: “Come a minha ‘Aguenta Toco’!”. Ou algo como: “Chupa a ‘Almofadinha do Prazer’ agora!”. É ridículo. Sexo não rima com esse tipo de nomenclatura. E se me permitem, mocinhas, aproveito para deixar uma dica também ao homem que tem exagerado na criatividade na hora do coito: no momento do sexo, irmão, quando quiser se referir ao seu pênis, por favor, use a palavra “pau” – seja conservador e não corra o risco de fazê-la secar feito sapo em dia de chuva de sal. Nada de “Zé Pequeno” ou “Veiúdo”. Combinado? Votem em mim, e, se eu for eleito, farei uma lei que obrigará todos os pênis a serem chamados apenas de “Pau”. E as vaginas, na hora do sexo, sob risco de pena de morte, só poderão ser chamadas por aquele nome que a minha avó não gosta, que rima com “caneta” e que começa com o som que fazemos quando queremos dar um susto em alguém. E aí, votarão em mim ou no Pastor Everaldo?
E já que estamos falando de nomes, eu gostaria de escrever sobre algo que muito tem me incomodado: a necessidade que a sociedade tem de nomear, com precisão cirúrgica e demasiada racionalidade, todos os laços humanos. Hoje em dia é muito difícil dizer, sem que os outros façam cara de “explique-me melhor!”, que você simplesmente está com alguém. Eles pedirão mais e só sossegarão quando você classificar – como a sociedade costuma classificar – o seu relacionamento. Alguém certamente lhe perguntará: “Então você está namorando?”. E se você disser que “não”, será bombardeado com novas questões: “Só ficando? Noivos? Casados? Já sei! Ele é seu PA, adivinhei?”. Perceberam o tamanho da complicação? Andam burocratizando as relações, o que é bem preocupante, e pior: limitante. É como se “estar junto” nada dissesse, quando, na verdade, é o principal e a única coisa que importa. E se a nomenclatura que utilizar não for condizente com a nomenclatura que os intrometidos esperam de você, prepare-se para olhos arregalados e perguntas como: “Estão namorando há sete anos e ainda não estão casados?”.
Sob a ótica do amor, que diferença faz um altar ou o nome que caracteriza o seu estado civil? Para advogados, até pode fazer alguma. Mas para as vizinhas fofoqueiras, com certeza, de nada importa. Por que essa obsessão homérica pela classificação das relações? Nem sempre só existe isso ou aquilo. E às vezes pode não haver nome à altura de certas uniões.
Qual a diferença entre estar casado, morando junto e namorando? Respondo: apenas um papel, duas alianças e um território compartilhado. Só isso. Mas a mudança de status amoroso nada diz sobre a intensidade do amor. E, mesmo assim, as pessoas ainda insistem em achar que estar casado é mais sério do que namorar – como se casamento fosse a faixa preta e o namoro a branca. Como se o nome “casado” preenchido em algum formulário e a assinatura em um papel tivesse o poder de fazer o amor crescer, do dia para a noite. Ou melhor: do silêncio para o “sim”. Quanta besteira. Tenho certeza absoluta que a intensidade – e seriedade – do sentimento independe dos nomes que escolhemos dar para as nossas relações. Acredito, piamente, que o mundo está cheio de eternos ficantes que se amam mais do que recém-casados que, em plena Lua de Mel, já pensam no divórcio – ou em assassinatos.
Até os sentimentos, coitados, andam demasiadamente presos a terminologias que são incapazes de representar a imensidão de sinestesias que eles carregam. Um exemplo? A crendice de que é possível separar – como se estivéssemos lidando com água e óleo – a “paixão” do “amor”. Os especialistas, como se estivessem distanciando as serpente peçonhentas das inofensivas, dizem: “Essa aqui é paixão, cuidado! Aquela ali é amor, não se preocupe.”. “A paixão é mais intensa! Já o amor, meu caro, é mais duradouro.”, ouvi dizer – e já disse. Mas será? Será que paixões não podem durar vidas inteiras? E será que amores não podem perder a suposta incondicionalidade graças a um ato imperdoável realizado por alguma das partes? Um dia eu já me achei capaz de responder, hoje, entretanto, prefiro dar nomes a jabutis e salvar o mundo dos que acham supimpa usar o termo “Empurra-Útero” quando querem se referir ao próprio pênis.
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