Nuvens negras não se atraem – mas mancham o seu olhar
Volta e meia entro numa cilada meio exotérica – nem sei bem como isso funciona, mas entro – e passo a acreditar em nuvens negras, infernos astrais e que um problema, definitivamente, atrai outro. Mesmo, no fundo, sabendo que nada disso procede, parece que as situações ruins tem um ímã entre elas e se puxam na velocidade da luz. Criam uma espécie de Twister da vida real, que vai arrasando a gente para um lugar no mundo onde nada está bom.
Um exemplo: um dia ruim, nunca é só um dia ruim. É sempre um dia péssimo. A camiseta que manchou no café da manhã é o pólo negativo, que vai atrai o pólo positivo do cliente querendo uma reunião para hoje. A reunião atrai atrasos, que atrai perda de oportunidades, que atrai hora extra, que atrai desmarcar com a amiga que você queria ver, que atrai chegar em casa e tombar na cama às 21h e não conseguir dar atenção para o namorado que, por sua vez, atrai a 3ª guerra mundial embaixo do seu nariz.
Todo mundo já teve dias em que absolutamente tudo parece sair do controle. Em que você chega ao final dele e se pergunta se dá pra começar de novo e não manchar a camiseta pra ver se essa tempestade deixa de se formar. Eu tenho muitos.
O estranho é que, depois de um tempo, sempre fico com a sensação de que eles não foram tão ruins quanto pareceram. Até compartilho achando graça de ter passado a reunião com a mão no ombro para disfarçar a mancha. Faço um jantar romântico e retribuo toda a paciência do meu namorado com os meus rompantes. Percebo que foi na hora extra que eu vi uma cor diferente entrando pela janela do escritório e sinto paz.
Fico com a impressão de que as nuvens negras e o Twister foram se formando na minha cabeça, não no planeta. Me sinto naquela propaganda dos óculos que vão escurecendo progressivamente, sabe? Primeiro problema, um cinza de abate sobre a lente. Segundo, um tom mais forte. E quando vejo, estou de óculos escuros, reclamando da claridade de um dia de chuva.
Estamos precisando regular o nosso timing. Não esperar o dia seguinte para rir. Encontrar caminhos para a leveza, soltar a gargalhada que quase sempre está presa na garganta. Se vamos rir de nós mesmos amanhã, pra quê esperar?
Dias ruins existem. Eles são difíceis, passam lentamente e a gente chega ao fim deles segurando o peso do mundo nas costas. O ideal seria que fosse possível regular a lente para que não colocássemos entre um dia nublado e o nosso cérebro um vidro escuro, que torna tudo ainda mais difícil. Eu prometo tentar.
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