O mundo quer que você seja gostosa. E ele quer agora.

Só pelo título de ex-vice miss bumbum, Andressa Urach já seria absolutamente digna de uma dissertação de mestrado. Subcelebridades na sociedade do espetáculo – quem são? Onde vivem? Do que se alimntam? Como se reproduzem? E embora a ânsia pela fama e a tentativa de gerar protagonismo por meio de habilidades um tanto quanto questionáveis seja um assunto deveras sério, o buraco da conversa de hoje também envolve Urach e é bem mais embaixo.

Nunca foi fácil ser mulher. Se na Idade Média a Santa Inquisição nos mandava para a fogueira, na pós-modernidade ela nos manda para as clínicas de estética. Se até o início dos anos 30 não tínhamos direito ao voto no Brasil, nos anos dois mil e poucos, não temos direito a escolher ter o corpo que nos é conveniente. Quer dizer, temos. Mas sobre o corpo feminino paira uma pressão – ou melhor, uma repressão – que só entende quem a sente sobre os ombros. E os peitos, e as nádegas, e a barriguinha, e as coxas, e o nariz, e os lábios.

O Brasil foi o país que liderou o ranking de cirurgias plásticas em 2014. Nós, com o nosso ~saudável~ conceito do corpo-do-verão, passamos na frente dos Estados Unidos, com todo o seu peso histórico da felicidade comprável, das coelhinhas da Playboy e da mitigação dos efeitos corpóreos que o fast-food traz. Não é preciso ser nutricionista, médico ou personal trainer para saber que evitar a (para muitos inevitável) Coca-cola e a batata frita e dar aquela caminhadinha diária são práticas que, de fato, trazem um impacto positivo para a saúde. Mas os procedimentos estéticos trazem resultados visuais muito mais rápidos e perceptíveis. E é aí que mora o perigo.

Porque a gente não tem tempo para malhar até perder toda aquela gordurinha, então a gente inventa uma dieta louca pra não ingerir nenhum tipo de carboidrato-cruz-credo-deus-me-livre. A gente não tem tempo para tonificar as pernas tanto quanto a gente queria, então a gente aplica hidrogel. A gente não tem tempo para aceitar e aprender a respeitar nossos peitinhos pequenos, então a gente coloca silicone. Só duzentos ême-éle, que mal tem?

Se feito com um profissional qualificado, absolutamente nenhum. Acontece que a gente também não tem tempo pra checar o antecedente desse profissional. Porque o mundo quer que a gente seja gostosa. E ele quer agora. Porque enquanto a gente tiver peitinho e bundinha, a gente vai continuar fracassando na principal missão feminina: a de ser um mero bibelô. Porque enquanto a nossa barriga cair por cima da calça, a gente não é digna de botar um biquininho nem pra curtir uns coliformes fecais em Mongaguá. Porque enquanto a nossa fome de comida for maior do que a nossa fome de beleza, a gente vai estar fora do padrão. Que não sei exatamente quem criou para oprimir um mundo de mulheres que seriam muito mais felizes se não fossem escravas da indústria da moda e da beleza.

E Andressa Urach, e Sabrina Sato, e as Panicats, apesar de nos humilharem diariamente com seus supercorpos, são tão vítimas quanto a gente. Porque eu nunca vi celulite ser causa de internação. Agora, do hidrogel, já não posso dizer o mesmo.

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