O primeiro passo para ser feliz
Se eu tivesse a receita da felicidade, não precisaria me abrigar em hobbys libertadores ou taças cheias. Eu não tenho e, arrisco dizer, ninguém tem. Mas é fácil ir descobrindo a cada dia um novo passo pra tornar a vida menos sofrida – porque os infortúnios estão aí pra todo mundo, mas quem sabe viver acaba tornando-se mais imune a cada nova experiência.
E a primeira coisa que aprendi e que me libertou do sofrimento desnecessário foi ignorar. Ignorar más palavras, energia negativa e gente desnecessária – porque, francamente, algumas pessoas são desnecessárias neste mundo.
Se antes perdia o dia se alguém me dizia coisas desagradáveis, hoje olho e abstraio. Não se trata de tragar a maldade alheia pra depois cuspir a fumaça. Eu não absorvo a maledicência pra depois, como quem tem um espírito elevadíssimo, perdoar – até porque receio que não seria capaz. Abstrair é ignorar antes que aquilo possa entrar na nossa vida de qualquer maneira que seja. Pensar noutra coisa, ouvir uma música e contar uma piada, até que aquilo se vá, como um mau cheiro que passa de repente mas não te incomoda, por que você soube tapar o nariz a tempo.
Fico imaginando o tamanho da carga negativa destas pessoas que absorvem tudo de ruim que lhes acontece. Porque, lamentavelmente, acontecem centenas de coisas terríveis todos os dias, o dia inteiro: no trabalho, na esquina, no telejornal. Das tragédias inacreditáveis narradas no jornal nacional à negatividade que muitas pessoas do nosso cotidiano nos transmitem. Por vezes chovem desgraças – pessoais ou não – e absorvê-las é o primeiro passo para adoecer na alma.
Algumas pessoas passam a vida inteira levando tudo a ferro e fogo: Se perdem a hora pela manhã, deixam que seu dia inteiro se estrague. Se começam o dia com o pé esquerdo, tendem a passa-lo inteiro assim, por que não conseguem passar uma borracha naquilo que os importunou e começar a escrever um novo dia, um novo humor, uma nova vida. Se lhe dizem uma má palavra, estão prontas a ganhar um inimigo – e acabam, assim, acumulando dezenas de inimigos, porque quem nunca disse uma má palavra nesta vida?
Se lhe machucam, não perdoam; se lhe agridem, levam a vida inteira remoendo e se preparando pra responder à altura – sem saberem que a vingança é a maior prova de ignorância humana: perpetua-se um mal que poderia terminar ali. Prolonga-se o sofrimento apenas para devolvê-lo na mesma moeda, mesmo que o preço disto seja uma vida inteira de amargura.
Não digo que perdoemos tudo – porque eu mesma não posso. Não se trata de querer pacificar o mundo e nem exterminar a maldade no coração das pessoas. Ninguém seria capaz. Espero apenas que, algum dia, aprendamos a cuspir fora o veneno do mundo em vez de engoli-lo.
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