P.A.

Não que eu me importe de você saber algo sobre mim. Sou timeline aberta, acredite. Conto coisas do coração com a mesma facilidade que falo ‘tá frio hoje’. Sonho te beijando com a mesma frequência que acordo tentando entender porque você ainda é meu pesadelo.

Te descobri no pátio da escola. De cabelo preso e charme solto. E sim, você é uma descoberta. Acho que nesse dia você tava estudando para a prova de ciências ou, sei lá, contando para as amigas como gostava de dar para o seu namorado. Você amava outro. Agora ama outro. Não sou tipo eles. Sou tipo eu comigo mesmo. Meio torto e meio falante. Meio alto e fumo do blunt.

Gosto de copos cheios e dos seus cílios; imagino nossos filhos com esses olhos. Olhão preto e lindo. Imagino a bebedeira que geraria nossos herdeiros. Sempre gostei do sexo ébrio. Você também. Pouca força te dá tédio.

Será que se eu disser ‘casa comigo’ serei invasivo? Loucão eu. Nem te beijei mais que cem vezes. Só dá pra casar depois de beijar a centésima vez. Só dá pra casar depois de viajarmos juntos. Só dá pra casar quando você der querendo ficar.

Uns tempos atrás eu percebi o quanto o amor me deixou irracional: no fundo eu gostei quando você contou que roubaram seu carro; que você voltaria – ao menos por uma semana – a pegar o metrô comigo. Não posso te olhar muito quando saímos em casal. Geralmente estou com alguma qualquer que arrumo para te fazer ciúme. Há convenções sociais envolvidas, manja?

Seus cílios ficam imponentes com essa maquiagem que você passa neles. Sou homem e confesso que não sou muito de perceber brincos novos, mas percebo o jeito que você olha seus amores. Percebo como fico com dor no estômago quando lembro daquele dia da chuva que alagou a Zona Sul inteira. Te liguei depois do seu torpedo, você atendeu com um ‘ooooi’ que… aff. Só colocando no YouTube para o mundo ver e ouvir como aquilo foi lindo. Daí perguntei o que você faria naquela noite. Você disse que nada, eu pensei ‘hoje é tudo ou tudo’. Sou positivo. Convidei para o copo cheio. Você meio com receio:

‘- Mas você vai tentar me beijar de novo?’

Eu, tolinho na resposta: ‘Mas é claro que não.’

Você: ‘Ah, que pena.’

Sou tímido, fiquei vermelho e só não tive febre porque a chuva esfriava a minha nuca.

Lembro do primeiro ‘tim-tim’ daquela noite. A chuva já tinha parado. Os copos foram ao alto pelos ‘anos de amizade’. Esqueci agora como foi o último gole, mas lembrei de como, naquele exato instante, sua boca poderia me desviar dos planos de toda uma vida. Beijei. Sei que era só um tempo com o tal do seu namorado, mas – azar o dele – o tempo seria preenchido por mim.

E pela nuca é que eu fiz seu cabelo feliz. Sua saia era permissiva: permitia eu me apaixonar mais, permitia eu abençoar o criador de tecidos firmes como o jeans. Do bar para o meu ap. Do elevador para a sala. Lá o sofá virou seu palco. Coloquei o som, você sentou no meu colo, deu um gole no tinto, respirou fundo e falou ‘tira meu vestido’. Tirei e sua cintura, um puta que o pariu, né? Não que o sexo tenha sido ruim. Pelo amor de Deus. Longe disso. É que cintura fina e cérebro largo me dão um nó.

Tô falando tudo isso, mas já devia ter parado. Afinal, você pegou o táxi antes de eu acordar. Como disse no começo desse texto: não que eu me importe de você saber mais sobre mim; mas é que você sabe tanto que não sobra nenhum canto para eu finalmente te contar tudo.

Na agenda do celular você poderia estar como ‘melhor amiga’, mas, sem ninguém saber, chamamos um ao outro de P.A.

Você me chama de pau amigo, eu te chamo de paixão antiga.

Comentar sobre P.A.