Quem decide qual o tamanho dos nossos problemas?
Dia desses, em um chat coletivo entre amigos no Whatsapp, acabei desabafando sobre pequenos problemas que estavam acontecendo comigo durante um mochilão pela Califórnia, que já durava quase 30 dias. Não eram coisas graves, mas eram vários pequenos incidentes que aconteceram em menos de dois dias e tinham me deixado aborrecido, eram aquela típica obra de Murphy para uma inocente terça-feira. Perda de câmera, bloqueio de cartão, chuva atrapalhando meu roteiro, itinerários longos, cansaço, dores por conta das caminhadas, etc. Obviamente, quando você reclama de algo, dentro do contexto de uma viagem, as pessoas tendem a minimizar a sua queixa, achar que é frescura sua, afinal você está viajando e elas estão lá, trabalhando. Pois bem, foi exatamente isso o que aconteceu comigo. Após meu desabafo, uma das amigas do chat soltou uma ironia do tipo “nossa, quanto sofrimento”.
Pensando em todos os problemas graves do mundo, em toda a miséria existente na humanidade ou simplesmente pegando isoladamente item por item das minhas reclamações, é bem provável que cheguemos à conclusão de que sim, foi um belo mimimi da minha parte, embora eu duvide que algum de vocês nunca tenha passado por uma junção de problemas superficiais que em um dado momento pareceram o fim do mundo. Levando em conta também que uma viagem, seja lá pra onde for, não é o tempo todo perfeita, não é constituída apenas daquelas fotos sorridentes no Facebook. Uma viagem possui sim seus altos e baixos. A gente pode errar o caminho, acordar de mau humor, sentir preguiça, ficar com saudade de casa ou perder a paciência com cobranças de chefe no meio da sua diversão. Por fim, sendo muito, mas muito honesto, eu não sou uma pessoa negativa, que vive reclamando de tudo, muito menos sou de ficar desabafando com os outros, ao contrário, costumo ser acusado de exagerar na felicidade – aquele tipo que acorda irritantemente num musical.
Nem sei se o comentário da minha amiga possuiu uma potência de sentido e gravidade que justificasse um texto desses, mas esse pequeno episódio me fez pensar no quanto temos dificuldade de exercer algo chamado de “empatia”. Tenho lido muita coisa sobre isso ultimamente e tal termo, possui um significado altamente importante para as pessoas que procuram estabelecer relações saudáveis com seus entes. Empatia é um ato de generosidade, é quando estamos receptivos ao mundo do outro, sem a interferência dos nossos padrões rígidos pessoais sobre a realidade. Isso envolve primeiramente se interessar pela experiência do outro de forma imparcial, sem levar em conta as versões preconcebidas que você possui sobre ele e sobre o mundo, exercendo a audição em seu estado mais puro e relevante. Quando você lida com alguém já pensando que tal pessoa tende a ser assim ou assado, acaba caindo muito fácil na generalização e no reducionismo.
Na empatia você exerce uma visão quase que infantil – e ao mesmo tempo madura – sobre o tema em questão. É como se você descobrisse quem aquela pessoa é e o que ela sente, no exato instante em que ela revela o seu problema. Essa nova percepção acaba nos tornando solidários às diferenças e desapegados ao autocentramento das nossas certezas sobre o mundo. Nossa visão narcísica sobre a realidade faz com que criemos convenções e medidas sobre os problemas e achemos que só a nossa perspectiva é legitima e digna de importância. Existe a famosa frase “tudo é obvio desde que você saiba a resposta”. É achar que o seu problema é sempre maior do que o dos outros, é exigir tolerância de um terceiro sendo que você é intolerante com todo mundo, é corrigir a gramática do outro de forma opressiva e arrogante, pressupondo que o outro é obrigado a saber tudo que você já esta careca de saber. Ou, no recente caso das eleições, achar que quem não vota em quem você vota, é burro. Eu por exemplo, estou nesse momento praticando empatia em relação à amiga que não foi empática com os meus problemas desimportantes. Estou tentando entender e aceitar o porquê dela ter sido incapaz de ouvir meu desabafo sem menosprezá-lo.
É importante frisar que exercer empatia não é fácil. Para praticá-la é preciso driblar o ego e parar de achar que nós temos a solução para o problema dos outros. Às vezes o outro só precisa que alguém o ouça com atenção, para então se “auto-ouvir”. A empatia é necessária inclusive aos exímios conselheiros, já que eles provavelmente vão se colocar como protagonistas do problema alheio. O famoso “se colocar no lugar” pode ser uma armadilha. Mais eficaz que isso, talvez seja deixar que por instantes o outro “entre no seu lugar”, ocupe um espaço da sua atenção, sem que você ache que tem qualquer importância dentro dela
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