Saiba sofrer
Sentir a dor é necessário. Mas sentir mesmo, não jogar por baixo dos panos sem reorganizar e inverter as prioridades. Digo chorar, sofrer, consternar-se, para depois ser digno de sorrir verdadeiramente.
A gente só sofre por algo que ainda não entendemos ou aceitamos. Talvez poucas pessoas saibam disso, mas eventualmente isso mostre um pouco do viés da vida. Eu perdi meu pai e minha irmã nessa minha curta jornada de vida. Confesso que pra mim não há sofrimento maior do que esse, tão grandioso que talvez até hoje eu ainda não saiba onde colocar toda essa saudade. Talvez nos meus sonhos ou na minha vontade de viver, vai saber…
Se eu não tivesse sentido o que deveria ser sentido na hora eu provavelmente estaria sofrendo e confuso até hoje. É como botar um ponto final em uma paixão, saudade ou desavença com ódio, seria assegurar um sofrimento prolongado onde o ato de sofrer estaria sempre no presente. E eu precisava saber separar o passado do presente.
Sim, saber sofrer é uma inteligência emocional. Mas sofrer de não saber onde colocar a dor, de querer explodir em um quarto de quatro paredes, de se perder dentro de casa, mas principalmente dentro de você.
Sabe, talvez esse texto com sensação de nós sentados na varanda do meu apartamento tomando um vinho – cabernet sauvignon que na minha opinião combina com o inverno – seja a sensação de identificação mais gostosa que exista. Não quero falar difícil, brincar com os dizeres ou tentar intumescer a sua vontade, na maioria das vezes infantil, de dizer ao mundo que você está melhor.
Sofrer cuspindo suas pseudomelhorias ao mundo é coisa de adolescente e amadores.
Aceite estar desolado, mas não se desnude perante os outros. Sente-se no seu quarto, sala, ou até naquele sofá perto da varanda – igual ao meu – e leia um livro, respire, chore e guarde essas dúvidas e certezas pouco assentidas pra ti. Lide com isso de forma madura, aprenda a ser gente grande na marra, dome seus sentimentos e coloque-os no seu devido lugar. Cure suas mágoas clareando os seus horizontes e não postando fotos segurando um copo de bebida em uma festa despovoada de verdades.
Sofrer verdadeiramente não te faz menos homem ou mulher. O que te faz mais homem ou mulher é saber sofrer com maturidade.
O vazio da vida pesa. Pesa por não nos dar direção, por nos desnortear enquanto vida, mas principalmente por não fazer a gente se encontrar conosco. O vazio da vida está em viver protegido, sem amar, sem sofrer, sem arriscar, sem admitir a si quem você é, sem tirar as máscaras dos pudores, dos medos, dos preconceitos…
No auge das minhas vivências acredito que quanto mais velhos ou mais perto da morte ficamos mais perdemos a capacidade de mentir para nós mesmos. Parece que cada vez mais entendemos a importância de ter vivido uma vida digna de sentimentos e fluências verdadeiras. Os sentimentos vão ficando cada vez mais à flor da pele, pois só temos uma única chance de sermos verdadeiros. Pessoas em seu leito de morte são pessoas de verdade.
Esse é um texto da vida real, daquela que não se tem objetivo de ludibriar nem enaltecer ninguém, mas sim juntar pessoas e fazê-las sorrirem ou chorarem juntas. Então hoje eu escrevo para momentos. Que mudam de endereço, mas não de identificação. Que mudam de intensidade, mas não de insignificância. Que mudam de coração, mas não de essência. Pois quando a gente aprender a respeitar os momentos, talvez a gente aprenda a respeitar as pessoas.
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