Brigas virtuais e conjugais: ser feliz ou ter razão?
Um filme que chega em um momento completamente oportuno, em que as discussões em torno do sexismo estão no auge dos tópicos , desde que o aplicativo Lulu caiu nas graças das mulheres, e nos pesadelos dos homens.
Ponto negativo pra tradução: “Como não perder essa mulher” ( que faz o filme parecer uma comédia romântica americana) e que no inglês é “Don Jon”. Trata-se do apelido do protagonista, que remete propositalmente a uma figura de poderio fálico e viril já conhecida por todos: Don Juan. Joseph Gordon-Levitt, o namoradinho indie de Hollywood, emplaca como diretor estreante e cria um filme ágil, polêmico e veloz nas ideias. Me arrisco a dizer que esse é o filme desimportante mais importante do ano. Desde seu inteligente prólogo, que traz de maneira “sincericida” e cheia de ângulos sacados a mecânica masculina vigente nas relações modernas, principalmente as “solitárias”; sejam elas dignas ou não de aprovação. É um filme cafajeste rindo de sua própria mediocridade, é uma trollagem do cinema que chega como potencial isca para discussões de gênero.
Existe ali uma ironia ao machismo: os rankings sexuais, o cotidiano coxinha, a auto-afirmação entre os amigos, o foco na figura paterna como influência normativa na sexualidade masculina. Mas o que esse filme traz de diferente? É um longa que destranca a porta dos quartos, invade a intimidade do homem moderno, fala da compulsão sexual virtual, fala do gozo solitário, da masturbação, mas acima de tudo trata da auto-negociação que fazemos entre as nossas relações carnais e as virtuais, das prisões psicológicas que se estabelecem nas entrelinhas dos relacionamentos, e talvez a grande reflexão que ele proponha seja sobre o quanto o mundo virtual interefere no real nas relações.
O conteúdo do longa me fez pensar sobre um grande equivoco que acontece quando uma temática polêmica é retratada por algum veículo. Um filme que fala sobre nazismo não necessariamente é nazista, uma obra que fala sobre preconceito contra os negros não necessariamente é preconceituoso. Há uma diferença entre a exposição de um retrato discutível e esse retrato ser a própria propaganda de uma ideologia.
O objetivo nesse texto é não só faiscar uma discussão em relação ao conteúdo trazido pelo filme, mas salientar a importância da exposição de temas tidos como “tóxicos”, mesmo que um dos pólos existentes seja completamente pérfido, inadmissível, condenável. Falar do como nos comportamos dentro dessa retórica dos argumentos nos nichos contemporâneos.
É sempre de extrema valia a discordância ideológica, e as discussões em caixas de comentários que fervilham nas redes sociais. Quando isso ocorre, todo o catálogo de regras e bons modos da lugar a um produtivo tiroteio argumentativo. Essas discussões que – não por acaso – acontecem publicamente, muitas vezes são a nossa fonte de construção opinativa. É quando escolhemos nosso critérios para assumir um lado. Existem duas formas mais comuns para que escolhamos o possível lado mais razoável e defendê-lo: prestar atenção em alguém que você previamente já confiava no que diz respeito a ponderação e credibilidade crítica, ou se atentar ao embate de ideias, ou em como um argumento esfarela o próximo.
Acredito que nas redes sociais, a maioria de nós – inicialmente portando argumentos crus – somos soldados que atacam em segunda instância. Existe uma comissão de frente, uma minoria intelectual autônoma, admirável diga-se, que assume um papel voluntário, de se lançar na discussão com argumentos frescos, com desdobramentos primários, dão a cara a tapa a partir de alguma primeira reflexão arriscada sobre o tema. Após esse primeiro momento, entra a maioria de nós que inicialmente assistimos ao circo pegando fogo, percebemos como acontece a divisão do nosso círculo social virtual para só a partir daí escolhermos nossas bandeirinhas e entrarmos para um bloco ideológico.
A “argumentocracia” tem servido como um potente instrumento de mobilidade pra diversas discussões e mudanças de comportamento. Na cultura brasilera faz-se importante botar a sujeira na mesa sim, e nessa hora sejamos sensacionalistas, busquemos o tumulto de ideias, sem agressões, deixemos o eufemismo de lado, deixemos o bicho pegar, mastigar, RUMINAR. Não se matem, mas briguem por favor.
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