“Um beijo roubado” um filme que mostra toda doçura que existe na incerteza
“Minha mãe sempre me dizia quando pequeno que caso eu me perdesse para que eu ficasse parado no mesmo lugar, uma hora alguém me encontraria”
O adeus tem vírgulas, se arrepende na estrada e pode voltar para um novo adeus. Tem gente que escolhe um caminho mais longo e arejado para não se aborrecer com os impedimentos do trânsito. Um filme romântico de estrada em que o amor espera e respira fundo, a bagunça interna se reorganiza a cada quilômetro dos EUA, um beijo pra depois e outros montes de cartas trazendo a saudade. Há pessoas que vão pra longe para se livrarem de quem eram, até que a consciência repouse no autoperdão, até que não sobre mais lugar nenhum. Nesse filme a jornada importa menos, fala-se em distâncias, perto ou longe. Clientes que mesmo do outro lado de um balcão são percebidos por alguém olhando, alguém querendo aprender sobre as estratégias do nada. Num lapso, um dos beijos mais inesquecíveis do cinema, em silêncio, sem trilha, sem suportes de convencimento, o clima, apenas ele nos convence.
Veja o trailer:
“Precisamos sempre de alguém para nos dizer quem somos e o que fazer, mas quando resolvemos ir para longe disso é que realmente refletimos a nós mesmos”
“Um beijo roubado” é um filme bem executado, fotografa com muita glicose o azul, o vermelho, a sombra das paisagens e as mil luzes que contrastam o bar e metrópole. Lugares fechados que de repente se esticam em paisagens, parecem até o próprio coração ampliando suas possibilidades. A gente aguarda o café do coração abrir, um alívio, um “open” de permissão. A luz do neon por vezes acende para dar voz ao silêncio dos personagens. Personagens rasurados, condenados a amar e tantos outros símbolos recriáveis. Um molho de chaves pode representar o engarrafamento das emoções. Achar a chave certa, qual?
“- Ainda tem as chaves?
– Sim.
– Sempre me lembro do que disse. Nunca devem ser jogadas fora, para nunca fechar as portas para sempre.
– Eu lembro. Às vezes, mesmo que tenha as chaves, as portas continuam fechadas, não acha?”
Quando vemos Natalie Portman representando a desconfiança, vamos logo entendendo qual truque move a dor do jogador cafona. Blefar na vida ou no carteado, todas as fichas de quem não acredita em ninguém e por isso mente. Já a personagem de Norah Jones é uma fatura que demora a processar, mas quando resolve confiar na incerteza, mesmo machucada pelo engano, nos faz entender que primeiros enganos ou segundos não nos protegem dos terceiros ,mas talvez a chave certa possa estar na quarta tentativa. A não atuação de Norah nesse filme, foi uma aposta no cru, se não há atuação, há canto dentro de cada canto e o diretor Wong Kar Wai sabia. Colocar uma protagonista como alguém testemunha ao invés de alguém que incendeia o jogo, que soma e não compromete. A propósito, ela e Jude Law se beijaram 90 vezes até que a cena icônica ficasse satisfatória.
“Uma torta de Blueberry quase nunca é escolhida por ninguém, mas ela não tem culpa disso, e, portanto sempre estará lá intacta, porque de vez em quando aparece alguém que a escolhe, mesmo que não seja a predileta de ninguém.”
Para que o amor sinta esperança, lave com cuidado as Blueberrys. Seque as lágrimas com um lenço enfeitado, não tenha medo, despeje o azedo do suco de limão e misture os sentimentos. Deixe em algum lugar em que você lembre onde está. Em outro capítulo em forma de bacia misture açúcar, sal, maizena, e canela. Agregue ao mundo seco às Blueberrys. Cubra bem cada unidade dos sentimentos.
Deite a massa numa superfície ou em uma cama com flores, mas não a deixe grudar, a farinha ajuda nisso. Metade do amor vai em baixo. O recheio é agora, despeje com cuidado, não assuste. Aposte na manteiga em pequenas colheradas, ela ajuda na negociação de espaços. Manteiga escorrega, mas no meio do amor ela pode ser inofensiva. Feche por cima com o resto de massa, um pequeno corte é útil para que durante a ida ao forno o vapor não sufoque o encontro. Deixe os pombinhos se divertirem em 180 graus, por 40 minutos. Espie com a luzinha o que acontece, as cores mudam até borbulho acontecer. Nunca perca a oportunidade de sentir o perfume quente, ele é rastro de encanto. Não pergunte se foi bom, apenas coloque sorvete de vanilla. Tudo pode terminar com um beijo ou uma entrega de chaves.
Eduardo Benesi adorei cada palavra da sua narrativa, deu vontade de assistir o filme para mergulhar nessa bela estória. E para adocicar ainda mais o momento vou preparar uma deliciosa torta seguindo as instruções da sua receita ❤️️