Uma crônica sobre um dia comum

Como um bebê estupidamente precoce, acordei dez minutos antes do horário que havia programado para o despertador tocar. Senti raiva do pouco tempo que ainda me restava para descansar. Dormi novamente e, como sempre, não ouvi o despertador abrir o berreiro. Só fui acordar bem depois, já muito atrasado, com meu pai me perguntando se eu não iria trabalhar naquele dia. “Claro que vou!”, respondi com cara de cu amassado.

Meu pau estava duro, como em toda manhã. Tentei broxar para mijar em paz, mas, diferente das vezes que o meu pau havia me decepcionado diante de alguma mulher, ele se manteve rígido como se eu fosse o Frota depois da ingestão acidental de dez Viagras. Empurrei o pênis para baixo, fiz força para expulsar a urina da uretra e mirei no centro da privada, porém, como sempre, o jato quente insistiu em acertar a tampa e alguns azulejos. Senti raiva.

Abri a geladeira em busca de algo para acalmar o estômago. Não havia nada por lá. Aliás, havia, dentro dela, uma pilha, um leite travestido de iogurte, um pedaço de bolo que minha avó me trouxe antes de bater as botas e o controle perdido da minha TV. Pensei em suicídio, mas, logo desisti. Pois todas as facas estavam sujas e eu, como sempre, estava com preguiça de lavá-las.

Liguei a televisão. E, como sempre, dei de cara com a Ana Maria Braga rindo feito Gremlin possuído pelo Capiroto, ostentando um corte de cabelo que fez eu me lembrar de Fandangos sabor presunto. Mudei rapidamente de canal, afinal, ainda estava com fome. Fui para o Discovery Channel e, por lá, vi um homem comendo um olho de cabra. Juro que aquilo abriu ainda mais meu apetite, pois parecia um ovo de codorna bem suculento. Desliguei a TV. Pensei, mais uma vez, em suicídio. Mas, logo desisti, porque não tinha varal, banheira, lâminas de barbear, torradeira, secador e outros utensílios úteis para apressar a morte.

Estava muito atrasado. Sabia que precisava tomar um banho rápido. Mas, como sempre, dei-me o luxo de bater uma demorada punheta. Gozei pensando na mãe de um amigo. Ou será que virei os olhos imaginando a MC Anitta? Ou será que minha perna bambeou enquanto eu imaginava a Anitta mordiscando os mamilos da mãe de um amigo? Sei lá. Só sei que gozei no ralo, como sempre.

No caminho, já no busão lotado de outros atrasados como eu, percebi que o zíper da minha calça social havia estourado. Senti raiva. Era minha única calça social. Peça que comprei há muito tempo, para ir a uma festa de quinze anos. “Que merda!”, gritei alto, fazendo com que todos os olhares do busão se voltassem para mim. Você, neste exato momento, deve estar achando que estou exagerando e que um zíper estourado não é motivo para tanta raiva, certo? Não seria, se eu estivesse de cueca. Tirei a camisa de dentro da calça e, adivinha? A porra da camisa era curta. Entrei numa bad trip forte, pior do que aquelas que tinha quando fumava maconha. Comecei a suspeitar que todos no ônibus estavam de olho no meu peru. Sabia que não poderia aparecer no trabalho assim. Mandei um SMS para meu chefe informando que minha avó tinha morrido e que, por isso, não poderia comparecer. Ele respondeu assim: “Sua avó morreu de novo, seu filho da puta! Quantas avós você tem? Se ainda tiver alguma, peça emprego para ela.” Aquilo foi a gota d’água! Pensei, mais uma vez, em suicídio. Com tantos sovacos desprovidos de desodorante, matar-me seria fácil. Era só colocar o nariz em algum deles. Pensar naquilo me deu ânsia. Por isso, mais uma vez, desisti de me matar. Torci para que minha morte fosse natural e apostei todas as minhas fichas no motorista do busão. O cara tinha cara de cachaceiro profissional, saca? Mas o filho da mãe foi até meu ponto sem capotar. Senti muita raiva.

Pensei em ligar para meu chefe e implorar para que ele me desse o emprego de volta. Pensei bem e, por saber eu não tinha mais calças e nem telefone de costureiras, resolvi aceitar a demissão.

Entrei em casa, pisei em algo estranho. Era um pedaço de pizza. Aquilo me encheu de esperanças na vida. Comi na hora. Entrei no YouTube, procurei um vídeo antigo da Feiticeira (lembram dela?). Bati uma punheta e, já sem forças para me limpar, peguei no sono. Acordei com o maldito despertador. Não é que o cuzão estava atrasado! Olhei para o relógio, que marcava 15h55. Liguei a TV e sintonizei na Sessão da Tarde. E, como sempre, estava passando “Curtindo a vida adoidado”. Desisti de me matar.

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