Acabou a luz e acenderam as estrelas

Acabou a energia. Deve ter sido o poste. Sei lá. Tem 38% de bateria ainda, tá ótimo. Vou deitar na rede. Ler não dá, tá escuro. O céu ta bonito, de repente um post. Acho que o termo Lua de Cristal surgiu num apagão. A cidade é bonita sem luz. Como se apagassem as lâmpadas e acendessem as estrelas. Mas as estrelas sempre estiveram ali, na verdade. A gente prefere a luz do que o céu. A que ponto chegamos.

Será que alguém me deu like? A professora do primário, o ex-amor que faz falta pelo amigo que deixou de ser, a melhor amiga que sumiu. “Vai dar boa”. 18%. Melhor economizar. A vida sem energia e em modo avião deixa claro que a solidão é queda livre.

A rede balança. Faz silêncio dentro de fora de mim. A quantidade de “vamos marcar alguma coisa essa semana” silenciados pela rotina começam a cutucar as minhas costas como se fossem uma cama de pregos. Deveria ter dito para a Samara que ela pode desacreditar no horóscopo porque a mágoa já passou, pra Paula que eu admiro a coragem dela, pra Diane que é bom ter alguém que entende a minha necessidade de falar com Deus.

Será que o amigo que se foi é uma dessas estrelas? Me faz companhia, vai. Me diz uma música daquelas que eu nem imaginava que ia gostar e você sempre soube. Liga tua vitrola aí no céu.

Não adiantou e o silêncio continuou. Deveria ter contado pra Ana que me dá um medo violento estar chegando nos 30 pra ouvir ela me dizer “para de besteira e segue o barco que a gente é feliz pra cacete”. Não deveria ter mentido que estava tudo bem.

Deveria mandar flores. Eu adoro mandar flores e mando tão pouco. A última vez, nem lembro. “Uma flor é uma rosa, uma rosa é uma flor”. Obrigada, estrela. Agora tem música na minha cabeça e é Elis. Deveria ouvir mais Elis e ver menos Youtube. Será que Maria Rita vai cantar Elis no show?

No fundo eu acho que todo mundo se sente só. A gente só tem a gente no fim das contas. Um amor pra dividir é lindo, ter amigos é maravilhoso. Mas às vezes a energia acaba. Não tem luz. Não tem celular, Facebook, Facetime. Não sei de cor o telefone de ninguém, quem é que liga hoje em dia? Endereço também não tenho ideia. Faz mais de 10 anos que não mando carta.

Na insônia, no breu, no silêncio. Não importa. Estar sozinho só comprova como é bom não ser. Mas, no fundo, é o que a gente se tornou quando percebeu que dor não se compartilha, novidade se conta online e sempre dá pra escrever ao invés de falar. Falar dói mais. Discutir é sempre texto, nunca voz, muito menos olho no olho. Achando que estamos nos protegendo, estamos nos isolando.

Voltou a energia. Melhor plugar logo o celular. A luz azul da tela é mais forte do que a luz de casa. E infinitamente mais poderosa do que o brilho das estrelas. Chegaram 11 e-mails. Tenho que responder todos com urgência. Olha, já são 18 likes.

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