Não diga só que me ama, diga que me entende…

Poucos me conhecem. Sinceramente? Talvez ninguém. Nem minha família, nem meus amigos, muito menos as pessoas que esbarram comigo pelas ruas e me olham como se soubessem tudo sobre mim. Elas não sabem. Eu não sei. As loucuras que guardo comigo são difíceis de explicar e impossíveis de entender e, se nem eu me entendo, não seria justo impor o contrário.

Não se sentir compreendido talvez seja a maior dor de quem carrega algo diferente consigo. É árduo, é conflitante, é doloroso até nos aceitarmos de tal maneira. E a gente demora tanto para se aceitar, uma pena. Lidar com o algo diferente que há dentro da gente é uma luta constante. Seja a diferença que for. Seja o formato, a sensibilidade ou a loucura que nos faz companhia. Poucos entenderiam. Poucos se doariam a entender. Dividir a nossa loucura com quem não é merecedor de ouvi-la talvez seja a maior loucura que possamos cometer, pois, a confusão é algo muito pessoal para ser dita assim aos ventos.

Tudo que escrevo é uma meditação sobre mim mesmo. É um equilibro entre as coisas submersas que convivem dentro de mim. Enquanto alguns querem, insistem, em colocar um mundo que está fora para dentro de si, o meu problema sempre foi colocar para fora o mundo que está dentro de mim. Desde de pequeno eu nunca vi o pôr do sol como os outros. Isso, para mim, sempre foi uma luta interna. O pôr do sol, a meu ver, nunca foi amarelo. Era laranja-tangerina. No colégio, o olhar da Cecília, nunca foi só o olhar da Cecília. Era o olhar de uma menina que tinha olhos fundos, coração grande e um medo gigante de não ser feliz. A saudade do meu pai, nunca foi só a saudade do meu pai. Era a saudade de um abraço no colo, da paciência que, volta e meia, não tive, das perguntas que não fiz e queria tanto, mas tanto, ter feito. Uma música que gosto, nunca foi só uma música que gosto. Era a minha música, eu tinha direitos emocionais sobre ela, enquanto eu a ouvia, voava rente ao mar, me sentia leve e especial. Minha sensibilidade sempre me deixou à mercê das emoções, eu sofria sozinho, ria sozinho, lia os livros que ninguém gostava de ler, via os filmes que todos achavam chatos, me sentia vivendo sozinho, mesmo quando rodeado de gente.

Tudo isso até a gente encontrar alguém que veja o pôr do sol como nós. De cabelo liso e ideias enroladas, me lembro, vagamente, por ainda me doer, da única mulher com quem fiquei e me senti totalmente compreendido. Nela havia qualidades que só eu conseguia enxergar. Mesmo parecendo algo vaidoso, sentia como se ela fosse feita para mim. Ela me lia como ninguém, sabia que meu olhar era doce quando eu estava com ódio, que eu tinha uma grande amizade com as minhas dúvidas e medos, sabia todas as oscilações que faziam parte de mim, ela entendia o meu todo, minhas besteiras, o meu interior, a vibração do meu beijo.

Por mais louco, e criminoso, que seja dizer isso, eu sempre admirei aqueles casais de filmes em que o marido ou a esposa matam alguém e, ao invés do parceiro dedurar e gritar aos quatro-ventos “Meu cônjuge é um assassino”, confiava na pessoa e dizia que juntos eles iriam resolver. Não que eu pense em matar alguém, longe de mim, mas essa cumplicidade, na maioria das vezes, irreal, se assemelha ao que eu gostaria de viver nos meus últimos dias. Obviamente, trocando a parte do assassinato, para algo mais leve e semelhante a: “Vou largar meu mestrado em medicina para me dedicar a montar barquinhos de madeira”.  Saber que ali existe alguém que te compreende e tem orgulho do coração oscilante que você carrega, é indescritível, é impagável, é a melhor sensação do mundo.

Acontece que quando a gente encontra alguém que, mesmo sem motivo algum, se doa a nos entender, a gente sabe que ali existe verdade. Existe amor, existe carinho, existe uma troca sem motivos de não ser sincera. E a verdade, perto da beleza e do tesão, é piada pronta. A verdade é o que há por trás das palavras engasgadas, dos amores que não vivemos por completo, do passado que nunca dividimos por medo que não compreendam as nossas atitudes, das tristezas que demoraríamos lagrimas para contar, da dor que a gente carrega no peito – mesmo que nem sempre consigamos deixar somente no peito.

Então, quando, no meu tempo vago, fico observando como as pessoas amam, só peço para que haja mais amores compreensivos por aí. Não para compreender, somente, que hoje chegarei mais tarde, que com a Maria só existe amizade ou que, acredite, não consegui te ligar pois acabou a bateria do meu celular, isso é o básico, é o arroz e feijão de uma relação saudável. Digo compreensão no olhar, no beijo, no sentimento de eternidade, de calmaria e afeto. Compreensão é a melhor qualidade de um amor, de uma amizade, de uma família.

Hoje, sabendo que o fim de tarde é fim mais bonito da vida, sei que no amor, busco um lirismo, quem sabe, inexistente. Por já ter vivido algo grandioso, não nivelo por baixo, brinco, me divirto mutuamente com quem me vende um sorriso encantador, mas, sentir algo transcendental, são poucos e breves momentos. Mas, por que tão breve? Por que esconder o segredo de uma alegria que um dia já sentimos? Por que tantos porquês se o que nós queremos é só ouvir um: “Eu te entendo…”?

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