Quando a solidão fica mais gostosa do que algumas companhias
Quem me lê de vez em quando sabe o quanto eu gosto de gente. Sempre fui convicta de que a coisa mais importante da vida são as pessoas que cativamos ao nosso redor e persisto na ideia de que poucas coisas são mais alegradoras do que colo, carinho, comida e conversa. A verdade é que as relações são – e sempre serão – uma prioridade na minha vida, mas devo admitir que hora ou outra, por cansaço ou decepção, a gente acaba percebendo que certas companhias não valem o sossego e a sensatez trazidos por um bom bocadinho de solidão.
Digo isso porque não tem jeito: a gente sabe que precisa das pessoas. A gente sabe desde sempre. A gente se apavora na falta de companhia porque aprende desde a infância que solidão é tristeza. Que solidão é castigo. A gente tem medo da solidão.
A gente tem medo e com razão. É justamente a consciência de que precisamos dos outros que nos ensina a adubar as relações que nos alegram e a valorizar as pessoas que nos trazem bons momentos. Temer a solidão é essencial no processo de valorização das relações, mas assim como quase todo temor, o medo de solidão tem uma medida certa. Medo demais vira pavor e pavor nunca é bom.
Vocês sabem: quase todo o mundo tem um pouquinho de medo de altura. É esse medinho que nos torna mais prudentes e nos protege de qualquer vontade súbita de debruçar na janela do nono andar. É o medo do bom senso. O medo protetor. É esse o medo bom. Já quem se apavora com altura e não consegue lidar com a ideia de tirar os pés do chão, às vezes pode se privar das delícias de uma montanha-russa, das belezas de uma vista panorâmica e das alegrias de uma viagem de avião. É esse o medo ruim. É o medo da privação.
É justamente assim. Da mesma forma que o medo da solidão nos ensina a ser mais responsáveis com os sentimentos das pessoas que amamos, o medo desmedido pode nos fazer cometer aquele velho erro de desejar companhias que não valem o sossego e calmaria da nossa solidão.
Com o tempo a gente aprende. A gente aprende que as pessoas são maravilhosas, mas a solidão também tem suas alegrias. A gente aprende que curtir a própria companhia pode ser um privilégio e que não é todo o mundo que merece ter a chance de perturbar nossa calmaria. Com o tempo a gente aprende que lidar com a solidão proporciona autoconhecimento e nos ensina até a nos relacionar melhor. Com o tempo a gente aprende que as relações só são gostosas se forem recíprocas e que não tem muito jeito: mais cedo ou mais tarde a gente aprende a se amar e a solidão fica mais gostosa do que algumas companhias.
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