Tô com saudade

O tempo não volta, ela disse. E isso é uma dádiva, eu complementei. Ela riu. Disse que algumas coisas poderiam voltar, sim. Eu também ri. Lembrei dos nossos momentos juntos, de tudo que tínhamos vivido até ali e de como os sorrisos sempre se misturavam no meio dos beijos. Ainda assim, foi inevitável o gosto amargo na boca quando a gente se encarou mais uma vez, mas, dessa vez, parecendo a última.

A vida tinha ficado pesada demais pra nós dois.

Precisávamos seguir. Ela tentou ir embora, eu a puxei pela mão. Dei outro abraço e perguntei “como é que eu vou te encarar da próxima vez?”. Ela franziu a testa, tentou se desvencilhar e acabou me empurrando. Desculpa, disse, mas é melhor que a gente saiba guarda o que passou com carinho. Se não dá agora, que a vida seja legal e faça a gente se encontrar só quando tudo estiver no lugar.

Eu abaixei a cabeça. Ela estava certa. Os passos que deu se tornaram reticências e eu fui obrigado a permanecer imóvel. Não havia nada a ser feito. Tentei rebobinar os últimos acontecimentos e comecei a notar que fomos nos perdendo aos poucos e que, com a rotina, deixamos o carinho se transformar em formalidade, o “eu te amo” em “como vai você?” e não soubemos nos reinventar.

Tive de puxar na memória algumas brigas, coisas horríveis que dissemos e, pelo menos naquele instante, fui embora puto e com a sensação de que tinha sido tarde mesmo aquele desfecho. Desejei que ela não tivesse sorte, mas meu medo dessa coisa de Karma me fez repensar. Desejei apenas que ela pensasse bem no que estava fazendo. E que o melhor aparecesse.

É doloroso se perder o que se acostumou a chamar de “grande amor”. O tempo não volta, ela disse, e aquilo ficou martelando na minha cabeça como um pendurar de quadros numa casa nova: ficam as lições em cômodos vazios e desocupados, necessitados de novas histórias para ali rechearem o ambiente de Vida.

Talvez fosse isso mesmo. Cada um precisava cuidar de si antes de olhar para fora novamente. Eu, observando com mais calma o que realmente ainda existia em mim, desejei que pudéssemos ser um desses casais que voltam ainda melhores e que entendem pelas noites sem sentido e amanheceres sem graça sozinhos que ainda vale à pena lutar pelo que é sentido. E que dá sentido.

Mirei o futuro e tratei de viver sem a pressão do “o que tiver de ser, será”, mas entendendo que há certos males que vem para o bem – ainda que o bem demore a aparecer. Não vou dizer que toda noite de insônia eu penso em ligar, mas sempre chega aquele dia que não dá pra suportar, né? Deve ser por isso que estou aqui, na frente da casa dela, com um buquê e o coração nas mãos, ligando pra ver se ela atende e diz que está em casa.

E que estava me esperando, de alguma forma.

– Alô.

– Tô com saudade.

– Onde você tá?

– Na sua porta.

– Fazendo?

– Tentando te reconquistar.

Ela me olha pela janela, vê as flores e solta um “puta que pariu”. Que foi?, pergunto. Nada, ela diz. É só que minha mãe disse que esse dia chegaria. E você duvidou, afirmei. Achei que você tinha seguido, ela falou. Eu tentei. Eu também. Falhamos. Terrivelmente.

– Vem. Sobe logo, por favor.

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